No momento em que escrevo, há eleitores a votar para o sufrágio do próximo domingo em regime de "antecipação por mobilidade". Parece que as inscrições ficaram aquém do esperado. Mas, em modo pandémico, quem dá o que tem a mais não é obrigado.
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Aliás, o mais eloquente nesta campanha a dias do fim é a circunstância de ter, no essencial, decorrido em ambiente tradicional das campanhas. Isto é, nas ruas. Tanto mais quando os números oficiais de infecções crescem preocupantemente a cada dia que passa, embora sem as consequências de há um ano graças à vacinação. Será que, após as eleições, a pandemia vai ser encarada de outra forma? Não sabemos. As caravanas não se pronunciam. O próprio primeiro-ministro não larga a sua, obcecado com uma mirífica maioria absoluta que o livre de penduras. Costa quer "continuar a avançar" - em principio ninguém pode continuar sem avançar, nem avança se não continuar -, a "virar páginas" disto e daquilo e a atribuir intenções a terceiros que não possuem a menor aderência à realidade. A maioria parlamentar, que o apoiou até ao Outono do ano passado, acabou. O que quer dizer que as soluções governativas que ela gerou em 2015, na secretaria, e, por inércia, em 2019, acabaram. António Costa já não é mais um governante em ganho de causa, mas um primeiro-ministro em perda. Se ocorrem eleições agora é precisamente porque a maioria que ele inventou em 2015 esgotou-se. Costa perdeu-lhe o controlo a partir do governo, com o orçamento que pretende retomar se ganhasse, e no Parlamento. Bloco e partido comunista pedalam as suas próprias bicicletas, execrando diariamente o espectro de uma maioria socialista. Costa responde-lhes desabridamente como se não tivessem tido, os três, nada a ver com o situacionismo de Portugal nos últimos seis anos. A verdade é que os jogos florais das esquerdas não interessam ao país. Talvez seja altura de pensar em outra maioria que possa gerar uma governação menos "ideológica" e mais realista. Mais próxima das pessoas do que estritamente adequada aos caprichos da actual nomenclatura da Esquerda. É uma possibilidade que, uma vez mais, fica nas mãos dos eleitores. Não faço proselitismo partidário. Todavia, não posso nem devo ser mais claro. Gostava de outra coisa. De uma sociedade diferente da dos últimos seis anos. Sem fanatismos, nem ilusionismos ou redacções únicas. Culturalmente mais pluralista, adulta e aberta, e respeitadora integral das liberdades públicas. Não é impossível.
*Jurista
O autor escreve segundo a antiga ortografia