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Sei que o que vou escrever neste artigo não será consensual. Mas é meu dever fazê-lo num momento em que se aproxima o início de mais um ano escolar e, infelizmente, iremos assistir e ouvir falar de mais um conjunto de indignidades a que milhares de jovens que entram no ensino Superior serão sujeitos, a coberto do que se convencionou chamar de praxe.
Tenho quase 38 anos de vivência universitária, de simples aluno caloiro a professor catedrático. Mesmo durante as fases em que prestei serviço público em comissão de serviço noutras entidades, sempre procurei nunca me desligar da universidade e dos alunos que em cada ano frequentavam as disciplinas da minha área de docência. Por dois motivos: em cada ano os alunos que fomos encontrando têm sensivelmente a mesma média de idade, enquanto no meu caso já passaram 32 anos. Isto permite-me, obviamente, uma posição privilegiada na perceção direta da forma como os nossos jovens veem e encaram os desafios societários. Perceber, aprender, partilhar, discutir, analisar com eles as questões atuais e futuras em cada ano, é a melhor forma de poder ajudar a construir um futuro melhor; a segunda razão tem muito a ver com aquele que considero o maior desafio da universidade, que é o de fazer com que os alunos sejam a prazo melhores que os seus professores. Sem isso não há verdadeira universidade. Esta é a minha maior motivação por esta profissão, onde tenho tido a sorte de muitos dos que eu pude ajudar serem hoje profissionais prestigiados, que me retribuem com amizade e partilha de conhecimento o meu pequeno contributo para o seu sucesso.
Por tudo o que acabo de escrever, já perceberam que tenho muita dificuldade em admitir, ou sequer tentar entender, o lugar para o insulto gratuito, para o vexame pessoal, para a arrogância permanente durante meses consecutivos a que alguns ditos de "doutores", "veteranos", "membros de comissões de praxe", ou seja lá o que for, entendem por bem sujeitar a matéria-prima mais preciosa do ensino Superior, os jovens que em cada ano entram nesta fase do seu percurso académico. E já nem entro sequer nos domínios da violência física e moral, porque esses casos são do domínio da justiça.
Todos temos a perceção de que quanto pior é a instituição pior é a praxe! A melhoria da qualidade do ensino Superior também passa por prestigiar e dignificar a receção e integração dos novos alunos, porque eles são o nosso melhor ativo futuro.
* PROFESSOR CATEDRÁTICO DA UNIVERSIDADE DO PORTO