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No passado domingo, nesta minha habitual crónica, referi-me à decisão do Governo de instalar no Porto a sede do futuro banco de fomento como uma boa notícia, sobretudo tendo em conta a relevante missão prevista para essa instituição. E interrogava-me, tendo presente alguns exemplos do passado recente, se não teríamos apenas mais uma instituição de fachada, com um simbólico número de diligentes funcionários instalados num edifício de referência, mas com todo o poder de decisão centrado em Lisboa. Porque esta é que é, verdadeiramente, a questão essencial.
O que importa é saber se teremos no Porto a administração e as direções, as principais assessorias e os quadros técnicos relevantes desta organização ou uma espécie de caixa postal que recebe as solicitações que um diretor regional carregará todas as semanas para a capital. Diretor regional esse a quem será proporcionado um grande momento uma vez por trimestre, quando puder fazer a sua apresentação ao pleno do Conselho de Administração num "powerpoint " laboriosamente preparado por um grupo de estagiários.
Não é de retirar poder a Lisboa que estamos a falar ou da ambição provinciana de ver a Avenida dos Aliados reconvertida num pequeno Terreiro do Paço. O que será relevante é promover o desenvolvimento económico e criar emprego qualificado numa região que tem sofrido duramente com esta crise.
Há em Portugal uma visão centralista que atravessa todos os partidos, sem exceção. E é contra isso que é preciso lutar. Não posso esquecer a reação de um conhecido historiador, militante de um partido de esquerda, quando o Governo decidiu instalar na reabilitada Cadeia da Relação, no Porto, o Centro Português de Fotografia. "Então agora, quando precisar de consultar os arquivos fotográficos, vou ter de ir ao Porto? Não faz qualquer sentido!".
Razões para duvidar e para estar preocupados com essa febre centralizadora, temo-las de sobra. E ainda mais neste momento, quando a orientação definida pela troika para a racionalização dos meios e dos serviços é por muitos entendida como ordem para concentrar em Lisboa.
Isto mesmo sabem os funcionários da Metro do Porto. Esta semana, tornaram pública a sua preocupação com o plano de reestruturação da empresa, que antecipam como um primeiro passo para a sua extinção no Porto. E é de temer.
Começou-se por procurar desqualificar as sucessivas equipas de gestão por serem incapazes de encontrar solução para o elevado grau de financiamento que esmaga a empresa, como se o pesadíssimo investimento em infraestruturas realizado tivesse que ser pago totalmente pelos utentes.
Acresce que o projeto sofre de um pecado original - não houve critério na separação do investimento estritamente necessário ao sistema de transporte e do investimento em obras de arte e de requalificação urbanística exigido pelos municípios. O resultado foi um endividamento excessivo, que a empresa agora tem de suportar. Só que, por causa deste endividamento, foi-se procurando fazer opinião no sentido de que o atual modelo não poderia nunca resolver os muitos problemas em cima da mesa, como se a questão de fundo residisse no modelo de gestão e não na fórmula inicial de financiamento do projeto. Mas ninguém pode eximir-se a este "pecado". As sucessivas tutelas de diferentes governos foram validando esta orientação, que agora todos querem ignorar.
Depois anunciou-se uma gestão conjunta para o Metro e para a STCP. À partida, parece fazer sentido. Embora com especificidades algo diferentes, desta unificação podem resultar ganhos de eficiência e um melhor serviço prestado aos utentes. Acontece que, apesar de esta possibilidade ter sido avançada há longo tempo pelo Governo, não mais se ouviu falar dela. O que não deixa de ser estranho, face ao empenho inicialmente demonstrado. Parece, por isso, que outra coisa se prepara. Há que estar atento.
Qualquer iniciativa que vise retirar ao Porto a possibilidade de administrar diretamente a sua mais significativa empresa de capitais públicos, é inaceitável. Estou convicto de que nenhum dos atuais presidentes de Câmara da Área Metropolitana o consentirá. Como acredito que nenhum dos candidatos às próximas eleições autárquicas alguma vez o aceitará. Quando interrogada sobre o assunto, a tutela assobia para o ar.
É verdade que, para já, são apenas suspeitas e não mais do que isso. Fundadas suspeitas, poderá dizer-se. Mas, como muito bem diz o ditado popular, "não há fumo, sem fogo".