A pobreza e a exclusão social estão a galopar na Europa. Os últimos números divulgados pelo Eurostat não deixam margem a dúvidas: há quase 200 milhões de pessoas cujo presente é vivenciado em dificuldades e dispõem, atendendo às projeções de pouco ou nulo crescimento para os próximos anos, de um horizonte nada promissor.
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Já não há como disfarçar a realidade: a Europa vive um processo de declínio - e em xeque está mesmo uma das suas imagens de marca: o Estado social.
Embora no final venha a repercutir-se transversalmente, para já o empobrecimento europeu não se reflete por igual em toda a sua geografia. Este é ainda o tempo de definição (ilusória) entre países ricos e países pobres, num decalque Norte-Sul.
Infelizmente, os comportamentos solidários não são, até ver, tão transversais quanto o desejável. O modo como os países mais abastados recusam contribuir para o Orçamento 2014-2018 da UE é eloquente....
Nesta Europa em declínio, os esforços mais visíveis para a neutralização do sofrimento dos mais carenciados acabam, pois, por ser consequência da solidariedade do próprio povo.
O caso português do último fim de semana é paradigmático. Embora de bolsos cada vez mais vazios, o povo deu uma mostra de como é capaz de se unir no objetivo de minorar o sofrimento de concidadãos. Os milhares de voluntários envolvidos e as 2914 toneladas de bens recolhidos na campanha do Banco Alimentar ficam como prova de uma solidariedade notável.
Um envolvimento assim merece destaque. E é uma boa réplica - mais uma - de iniciativas similares de outras paragens, e de que a Espanha é o mais próximo exemplo.
Ou não pertencesse ao Sul, também a Espanha vive momentos complicados. Lá como cá, a sociedade civil exprime-se, encontra fórmulas de apoio aos mais necessitados. E em Madrid ou Barcelona, Valência ou Sevilha, uma fortíssima campanha está em marcha para dotar a Cáritas de 35 milhões de euros, capazes de matar a fome a uma parte significativa da população.
Como está provado, o povo dos dois lados da fronteira tem, pois, uma boa reação à desdita do parceiro do lado. E contribui.
Há, no entanto, uma diferença que convém também ser esbatida.
Como foi público e notório há meia dúzia de semanas, Amancio Ortega, o dono da Inditex (Zara, Massimo Dutti, Oysho, Pull and Bear, etc.) doou 20 milhões de euros à Cáritas. O terceiro homem mais rico do Mundo canalizou o dinheiro, é certo, através da Fundação com o seu nome - mas fê-lo. Por cá está por surgir, à dimensão do país, uma dádiva do tipo da de Amancio Ortega - e pouco importaria que fosse pela via das benesses subjacentes a uma fundação.
Nunca é tarde, ainda assim, para que seja dado a conhecer um Amancio à portuguesa.