"Olha, és tu a escrever hoje. Já sabes sobre o que vais escrever?" Não, não sei.
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Teremos sempre Paris, é certo, mas um intenso fim de semana a ver desfilar as histórias do terror, a afundarmo-nos no abismo das fotografias das vítimas, de vidas tão felizmente normais ceifadas pela estupidez dos homens, cada vez mais estupidamente normal, tudo isso esvaziou-me das interjeições inevitáveis e das juras à paz, que já foram todas proferidas durante essas noites de fecho do jornal.
Depois da intensidade dos primeiros dias, prevalece a sensação de repetição, de quem, como a esmagadora maioria da humanidade, só quer que isto pare. Que parem os terroristas e as mortes, mas também que parem o enunciado das medidas securitárias e os ataques à bomba. O melhor de dois mundos que os fanáticos impedem que possa existir.
"Podes sempre falar do Cavaco". Poder posso, mas todos queremos é que ele fale. Que o presidente da República decida, para que 47 dias depois de terem votado, os portugueses possam conhecer finalmente quem os irá governar. Pelo menos nos próximos meses, já que o mais provável é que não demore muito até terem de ir às urnas outra vez. Quero saber o que é que vou explicar agora aos meus amigos galegos, que, sentados à volta da mesa de um restaurante em Vigo, me intimavam: "Precisamos que alguém nos explique como é que se indica para formar Governo quem não tem maioria no Parlamento".
As coisas não são assim tão simples, mas também não deviam ser tão complicadas, para um presidente que foi taxativo no dia das eleições: "Temos estudado todos, todos os cenários, todos os cenários foram estudados na Presidência da República ao longo deste tempo. Agora, só nos falta saber qual o cenário que vai ser determinado pelos portugueses depois das sete da tarde". Os portugueses votaram e o tempo do presidente continua a ser do empatar.
"Tens sempre o novo Parlamento". Mas a Assembleia da República também está em suspenso a tentar perceber quem é Oposição e quem é Governo. Anda às voltas com o passado, com a maioria de Esquerda a apagar as alterações à lei do aborto que a anterior maioria de Direita aprovou em fim legislatura e também a discutir o 25 de novembro. O 25 de novembro? Sim, os partidos que não se detiveram perante o caráter simbólico dos feriados da Restauração e da implantação da República, queriam reunir para preparar as celebrações dos 40 anos do 25 de novembro, daqui a cinco dias.
"Apetece-te escrever sobre isso?" Não, não me apetece.