Não, não é a norma em todas as universidades e centros de investigação
Onde há relações de poder, há riscos de abuso de poder, de autoritarismo, de chantagem, de manipulação, de assédio moral e sexual. Nas universidades como em todas as outras instituições.
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1. Mas não é tudo igual em todo o lado. No caso da academia, sabemos que os riscos de abuso são sempre maiores em instituições onde, por exemplo, não se respeita a limitação de mandatos e os dirigentes se perpetuam nos cargos confundindo-se com estes; ou onde não se garante o equilíbrio de género nos órgãos de direção e de gestão; ou onde a diversidade e pluralidade interna são anuladas por mecanismos de silenciamento; ou onde os poderes internos de controlo, fiscalização, coordenação e execução não são distribuídos e se concentram nos mesmos; ou onde se transforma a hierarquia académica em mandarinato. Os riscos devem ser minimizados com regras e com determinação em as aplicar. Generalizar, dizendo que é tudo igual em todo o lado, desculpabiliza as más práticas e não ajuda a identificar o que devemos corrigir. Não permite distinguir as boas soluções institucionais e organizacionais, que devem ser generalizadas, das más soluções, que devem ser corrigidas.
2. Os comportamentos abusivos também não têm todos a mesma gravidade ou consequências. O predomínio de uma cultura de encobrimento e desvalorização do assédio sexual ou moral, que atinge de forma particular as mulheres, manifesta-se de muitas formas e tem diferentes graus de gravidade, na academia como noutros espaços da vida pública e privada. Sendo todas condenáveis, não podem ser colocadas no mesmo plano as ações que excluem as mulheres do espaço público, as ações suscetíveis de provocar ofensa e vergonha, ou intimidação e humilhação, as ações de abuso de poder e chantagem, ou as ações de violação ou violência física contra mulheres. Todas as vítimas merecem apoio e solidariedade. Todos os casos importam. Porém, mostrar igual indignação com situações de gravidade tão diversa torna mais difícil definir uma agenda de mudança. Afirmar que é tudo igual e que só há um caminho para a mudança do tipo tudo ou nada corre o risco de introduzir na agenda dessa mudança uma forma autoritária de olhar o Mundo. E pior, de tornar o feminismo refém dessa visão.
3. Porque não vivemos, nem viveremos nunca, em sociedades perfeitas, os riscos de abuso de poder nunca serão totalmente eliminados. É com essa consciência, com o conhecimento dessa nossa circunstância de gente comum e banal, que devemos e podemos melhorar sempre, nunca desistindo de construir instituições mais fortes, inclusivas e decentes.
*Professora universitária