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1. Não é fácil encontrar um tema novo, em cada semana, que justifique o esforço de redação desta crónica. Nas mais recentes, abordei dois assuntos que todavia continuam a alimentar comentários requentados ou a aguardar previsíveis desenvolvimentos.
2. A nomeação da procuradora-geral da República ainda suscita intermináveis análises, sem que o "Expresso" tenha até hoje apresentado aos seus leitores uma retratação convincente, por ter concedido honras de primeira página a uma notícia falsa, contrária a toda a evidência já então disponível, e que só por intuitos políticos inconfessados carecia da verosimilhança emprestada por um semanário respeitável. Esta é a única questão relevante que resta esclarecer.
3. Por seu turno, a nomeação do novo juiz escolhido pelo presidente Trump para o Supremo Tribunal dos Estados Unidos da América - que abordei na última semana - transformou-se numa novela escabrosa sobre os excessos do candidato, quando jovem adolescente. Estranha-se apenas que Brett Cavanaugh ainda não tenha desistido desta corrida inglória. Independentemente da verificação dos factos que entretanto se vão multiplicando, o que já resulta claro é a moralidade hipócrita que marca o caráter - ou falta dele! - deste indigitado juiz do Supremo que apenas não desiste, concedemos, porque a sua nomeação é demasiado urgente para o presidente que o convidou...
4. E por falar em hipocrisia moralista, vem inevitavelmente a propósito o espetáculo deplorável de censura institucional impunemente exercida pela Administração de Serralves sobre a direção artística que escolheu. Continuamos a falar - claro! - da exposição de fotografia de Mapplethorpe e da imposição de critérios de pretensa moralidade ou conveniência, que pelos vistos ali se pratica há demasiado tempo, contra a liberdade e a decência indispensáveis às artes e à vida!
5. No plano das novidades recentes, falta ainda o caso - também rocambolesco! - da definitiva localização do Infarmed. Que ele nunca viria - realmente! - para a cidade do Porto, era minha convicção, desde o início. A forma atabalhoada como foi anunciada a sua "deslocalização" e, depois, a sua "relocalização" pelo sr. minisrto da Saúde denuncia contudo um problema bem mais grave: é exatamente a mesma leviandade com que foi tratado o Infarmed que preside à sistemática localização, na capital, de todas as instituições relevantes para os cidadãos, para o país e para a nossa economia. E isto dá para perceber as dificuldades que atravessamos com o pacote legislativo da descentralização... já para não falar, uma vez mais, sobre o processo eternamente adiado da criação das regiões administrativas!!!
6. E uma vez que a hipocrisia e a incredulidade são os tópicos que dominam a minha crónica de hoje, tenho ainda que lembrar a novela das atribuladas negociações preparatórias da anunciada saída do Reino Unido da União Europeia. Continuo a não acreditar que a saída venha a consumar-se, mas a verdade é que até Jeremy Corbin, presidente do Partido Trabalhista, muito cético quanto à União Europeia, com respeitáveis argumentos, já admite uma novo referendo, embora rejeite os termos que o presidente da cidade de Londres, seu correligionário, publicamente recomendou: um novo referendo sobre a saída e não, como agora admite Corbin, apenas sobre as respetivas condições.
7. E por fim - para aliviar a náusea! - não é de todo verosímil que sejam os piratas informáticos russos os responsáveis pelo Brexit, pela eleição de Trump ou pela ascensão de outros neofascistas na Polónia, na Hungria, na Áustria ou na Itália. Mas que a desregulação global tenha permitido que o Facebook se transforme em fiscal da liberdade de expressão e da moralidade pública, isso sim, é a mais séria ameaça às democracias e aos valores universais que as suportam. Sobre isto, nunca nos cansaremos de escrever!
DEPUTADO E PROFESSOR DE DIREITO CONSTITUCIONAL