A Europa continua como se nada tivesse acontecido e os seus estados incapazes de abdicar de algum do interesse nacional para satisfazer as necessidades mínimas de coesão na União.
Corpo do artigo
Apesar de conscientes de que o processo de globalização de pessoas, mercadorias e capitais está a sofrer percalços impensáveis mas evidentes perante a crise financeira, até nos países mais desenvolvidos do mundo ocidental, os líderes políticos europeus não se entendem quanto ao essencial: a solidariedade orçamental que permita à União superar a calamidade comercial soprada dos EUA, o nosso principal concorrente, mas também de vigorosas potências emergentes, como a China, a Índia, o Brasil ou até da vizinha Turquia.
Ontem, mais uma vez, os 27 estados não conseguiram acordar os termos orçamentais para 2014-20 devido a divergências clássicas e tantas vezes vistas no passado entre o grupo daqueles que pagam mais do que recebem e o grupo dos que recebem mais do que pagam. Agora com um argumento tão inválido quanto todos os outros utilizados no passado: o da falta de dinheiro. Quando deveria ser justamente esta circunstância de carência a acionar as políticas de coesão e os inerentes financiamentos sob pena de a União se estilhaçar às mãos de egoísmos que não protegem a maioria dos interesses das 27 bandeiras, consabidas que são as razões eleitoralistas, de ordem nacional, com que os líderes europeus se preocupam verdadeiramente e antes do mais.
Uma coisa é perceber que a união política não se fará nunca sem que cada um dos 27 estados obedeça ao mesmo critério de rigor entre despesas e receitas orçamentais e que disso se faça lei conforme vai acontecer entre nós, outra é entender como é que os países que cumprem com esse critério o tornem numa espécie de pedra filosofal, apenas porque os seus cidadãos não aplaudem ou até assobiam o mínimo esforço em dinheiro para manter a Europa mais ou menos unida de modo a poder jogar o xadrez do comércio mundial legal (não mafioso) há muito organizado segundo grandes blocos geográficos. Esta exigência de um bloco comercial europeu é tão evidente que as dificuldades dos líderes europeus em afirmá-la resultam num sinal da fraqueza europeísta das suas razões domésticas.
Se a União tivesse uma estratégia solidária, não seria uma emergência cortar 22 mil milhões de euros na política agrícola comum ou, pior, 77 mil milhões aos fundos regionais que garantem a coesão. Bastaria que os mais fortes, os mesmos que impuseram a lei do controlo orçamental, criassem a tão falada taxa sobre transações financeiras e tornassem dispensável a proposta inglesa para cortar 150 a 200 mil milhões até 2020. Não encarar esta ou outra solução solidária é sinal de que persistem sonhos de dominação.