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A comissão parlamentar de inquérito ao BPN encerrou os trabalhos. É pena. Estava a oferecer horas infindáveis de directos televisivos, com descrições detalhadas de ódios de estimação, sessões de chá e torradas com um preso preventivo, um diz-que-disse-mas-não-disse com um conselheiro de Estado entretanto dispensado da missão e outros suculentos nacos de show business político que não cabiam no horário nobre, porque se prolongavam pela noite dentro.
Os deputados terão dado por bem empregue o seu tempo. Ficaram, certamente, com a sensação de dever cumprido. Alguns, como Nuno Melo, aproveitaram para retirar efeitos políticos de um inusitado protagonismo que, investido nas eleições europeias, rendeu muitos votos. Todos desempenharam o seu papel a contento. O que nem sequer é grande proeza, uma vez que o guião fora previamente distribuído e o desfecho era conhecido de antemão. Sempre foi assim: o relatório final das comissões de inquérito traduz a posição da maioria partidária do momento; as oposições correm por gosto, sabendo que devem preparar um discurso crítico das conclusões.
Como se esperava, o PS só descobriu uns desculpáveis pecadilhos na intervenção do supervisor bancário. Nada de especial, nada que tire o sono à Nação, nada que justifique mais do que um vago podia ter sido "mais diligente". A "prova" de que nem andou mal de todo no processo está vertida no relatório, quando se afirma que os responsáveis do BPN até se sentiram incomodados com a acção do Banco de Portugal. Já o CDS inverteu as prioridades. Em Santa Filomena e noutros bairros-problema defende perseguição impiedosa aos criminosos, mão pesada que sirva de exemplo. No sector financeiro, não; quer é castigar o "polícia".
Valha a verdade que o "polícia" nunca se preocupou em policiar muito, porque lhe pediram uma intervenção soft, com meios a condizer. Nesse sentido, ocupasse outra pessoa o gabinete de Vítor Constâncio e o resultado seria exactamente o mesmo. Como escrevemos em crónica anterior, prevaleceu - em todo o mundo, não apenas em Portugal - a convicção de que entre os banqueiros só há boa gente. De que o mercado se encarrega de extirpar uma ou outra célula maligna. De que a regulação é o Estado a meter-se onde não é chamado.
Não é expectável que das conclusões da comissão parlamentar de inquérito ao BPN seja extraída alguma pista para aperfeiçoar o modelo de supervisão bancária. O mais provável é que o relatório seja atirado para o baú das inutilidades. Até porque esta comissão sofre do "pecado original" de ter realizado os seus trabalhos ao mesmo tempo que decorre uma investigação judicial.