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Não falta quem defenda que futebol e política não devem misturar-se. Não concordo e parece-me da maior utilidade usar a linguagem futebolística na análise política. Sobretudo se em causa estiverem sanções para os países que não cumprem os limites do défice. E mais ainda se a discussão do tema coincide, por uma feliz coincidência, com o tempo de umas meias-finais de um campeonato europeu em que estão Portugal e a Alemanha.
Vamos então por partes, lembrando os primeiros 45 minutos, ou seja, o que se passou até 2015. Quem conduzia então o jogo português era a coligação PSD/CDS e a tática era ditada por Bruxelas e Berlim, que impunham baixos salários, impostos elevados sobre os rendimentos do trabalho, cortes nas pensões e nos salários dos funcionários públicos. Numa ideia, austeridade à bruta. Era um jogo conservador, sem rasgo, obediente, como não podia deixar de ser com Passos Coelho a número 10. Jogava-se para o empate, com a esperança de resolver o problema nas grande penalidades. Saiu tudo ao contrário. Portugal ficou mais pobre, mais endividado e mesmo assim o défice ultrapassou os limites, sofrendo uma goleada que se avolumou de forma dramática quando percebemos que era preciso pagar o desastre do Banif.
Ao intervalo, os portugueses decidiram trocar de equipa técnica e a solução encontrada foi inédita, com um treinador de campo (o PS) e dois treinadores de bancada (PCP e BE). A mudança tática foi imediata: aumento do salário mínimo, redução do IRS, reversão dos cortes salariais da Função Pública. A equipa recuperou energia e, ainda que já não acreditasse na vitória, começou pelo menos a atirar à baliza contrária, na esperança de diminuir a desvantagem. E tudo indica que, ainda que continuemos a ficar mais endividados e manietados pelo jogo rasteiro dos adversários, poderemos chegar ao final da segunda parte com um resultado menos desfavorável, ou seja, e pela primeira vez, com um défice público inferior a 3% do PIB no final deste ano.
Com o que ninguém contava é que a "International Board" das políticas europeias (a Comissão Europeia), se lembrasse de alterar as regras a meio do jogo. Verificando que a equipa portuguesa joga agora numa tática mais ousada, com um número 10 (António Costa) mais habilidoso - ainda que isso não seja necessariamente sinal de eficácia -, a equipa de arbitragem alemã prepara-se para marcar, na segunda parte, um penálti que tinha perdoado a Portugal na primeira parte. É provável que assim se confirme aquela ideia de que, sendo 11 contra 11, no fim ganha a Alemanha. A propósito de penáltis, apetece repetir o que disse Ronaldo a Moutinho no jogo com a Polónia. O problema é que isto, tal como o futebol, é muito mais do que um jogo.
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