<p>Há 27 anos, já na última fase de uma longa vida (morreu em 2005, com 101 anos), o professor e diplomata George Kennan, chefe de fila do "realismo" americano, escrevia "The Nuclear Delusion". As suas observações sobre a URSS parecem datadas, ultrapassada que está a Guerra Fria. Mas o que disse sobre as armas atómicas merece ser relembrado. Começa por referir que, ao contrário da opinião dominante, o nuclear militar foi um erro. Desde logo, porque a perspectiva de destruição global torna qualquer conflito simultaneamente ilimitado e irracional. Em circunstâncias normais, é certo, a perspectiva de morte total parece ser um desincentivo ao uso da arma atómica. Mas e se o poder nuclear - por fervor místico, ou suicídio - prezar mais a destruição alheia à sua própria vida?</p>
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Kennan era um conservador. Mas propunha uma redução substancial nos arsenais dos dois grandes: até aos 80%, no caso americano. Essa diminuição drástica teria vários efeitos. Tornava o planeta mais seguro, criava uma nova dinâmica de desarmamento, podia dar exemplos.
Barack Obama, Nobel da Paz, é o único presidente americano a propor uma era pós-nuclear, substituída por nutrida dissuasão convencional. Terá pensado em Kennan, antes de assinar o START 2, esta espécie de novo começo.
A verdade é que, quase duas décadas depois da queda do comunismo universal, o vulcão permanece. Washington e Moscovo terão mais de cinco mil ogivas estratégicas, Reino Unido e França cerca de 500, a China 180, Paquistão e Índia cerca de 140, e a (não declarada) Israel talvez 80. Tudo junto, pode incinerar-se a vida humana, várias vezes, como nos piores sonhos do Doutor Estranho Amor.
Claro que, no novo tratado, ficam de fora as armas tácticas. Mas os EUA deram o sinal claro de que não construirão novos engenhos, que facilitarão e multiplicarão as medidas de fiscalização e publicidade, e que não usarão o átomo contra quem não o tem, e adira ao Tratado de não proliferação.
Poderá isto causar incentivos a terceiros? O Irão é um óbvio destinatário da mensagem, agora que vive num crepúsculo do TNP.
Mas o mais importante é a criação de um caminho. Os nossos filhos poderão viver numa era diferente. Com outras ameaças, mas não esta.
"Mais vale ser activo hoje, que radioactivo amanhã".