Como se sabe, há produtos de qualidade muito diferente. Essa diferença tende a traduzir-se em termos do preço: os produtos melhores são mais caros, os de pior qualidade mais baratos. Existe ainda uma outra relação: os produtos de menor qualidade são comprados, prioritariamente, em mercados menos sofisticados e em países menos desenvolvidos.
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Por razões relacionadas com políticas erradas e limitações na qualificação dos seus trabalhadores e na gestão das empresas, Portugal especializou-se em produtos de baixa ou média gama. O percurso para um patamar superior de qualidade tem vindo a ser percorrido, porventura a um ritmo inferior ao que todos desejaríamos. Acontece que na economia, como na culinária, não existem milagres e, se não se podem fazer omeletas sem ovos, também para produzir produtos sofisticados são precisos ingredientes, em termos de qualificações, concorrência, políticas e incentivos adequados, que não abundam por cá.
O desafio é, por conseguinte, o de criar as condições para que a evolução para produtos mais sofisticados se faça de uma forma sustentada e, entretanto, garantir escoamento para os bens e serviços que somos capazes de produzir. Não abdicar da ambição de fazer melhor (e ganhar mais) mas não embarcar na ilusão de fazer tábua rasa daquilo que somos. Para sermos um país moderno não basta decretá-lo.
Voltemos ao princípio. Produtos de qualidade média vendem-se em segmentos de mercado com um poder de compra intermédio. Não apenas o vestuário ou o calçado, mas os automóveis e os computadores. Como o "Magalhães". O primeiro-ministro compreendeu isso e aproveitou a cimeira ibero-americana para o promover. Fazendo aquilo que sucessivos governos, este incluído, só por excepção têm feito. Talvez tenha exagerado na rábula. Talvez se tenha colado demasiado a um produto e a uma empresa. Mas fez o que qualquer governante deveria fazer: procurar assegurar mercado para os produtos portugueses. Prática habitual na diplomacia estrangeira, em que a agenda política se completa com uma de natureza económica ou vice-versa.
Não em Portugal. Caem-nos os parentes na lama se o fizermos. Não espanta, por isso, que se tenha reagido ao episódio com o snobismo de nobres falidos, ridicularizando a iniciativa de Sócrates, arrasando-a e desmerecendo do produto. Fez-me recordar uma velha anedota. Numa visita ao Inferno, alguém reparou que, para todos os povos, o Diabo tinha guardas que empurravam as pessoas para baixo quando tentavam fugir. A excepção era Portugal. Interrogado esclareceu: "Aqui não é preciso. Quando alguém tenta fugir, os outros puxam-no logo para baixo!".
A dura realidade é que Portugal continua, e continuará, a depender da exportação de produtos de média tecnologia. É à custa deles que o saldo da balança comercial não é ainda mais calamitoso. O PM esteve bem ao promover o "Magalhães". Só se espera que a iniciativa se repita para outros produtos, mais ou menos elaborados, e não tenha constituído um fogacho esporádico. Quanto ao resto, se continuarmos a apoucar o que sabemos fazer, mesmo que não seja o que desejaríamos que fosse, vai ser difícil sairmos do pântano em que nos atolamos. Insistir em confundir desejos com realidade, resulta em políticas erradas que custam muito caro e não contribuem para o desenvolvimento do país.