Volto a um argumento que já aqui expus. Quando não vemos para além das nossas fronteiras, tendemos a considerar como peculiar e único aquilo que, na realidade, também acontece em muitos outros países, mesmo os mais avançados. O costumeiro "só neste país!" não é mais do que uma manifestação de ignorância e provincianismo. Por paradoxal que possa parecer, esta postura tem o seu irmão gémeo no snobismo, do género "este país não me merece", que campeia entre alguns intelectuais e cientistas estrangeirados. Em ambos, o resultado é mais ou menos semelhante: olha-se, com deslumbramento, para fora, para as soluções aí procuradas ou encontradas e propõe-se a sua importação, acrítica, para o nosso país.
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Na verdade, repito, muitos dos nossos problemas são comuns a outros países. Proponho-lhe um exercício. Vá ao Google e faça uma busca com base nas palavras education problems USA (creio que todos, mesmo os que não sabem inglês, percebem o pretendido). Se souber inglês e começar a ler os textos que aparecem listados vai ficar surpreendido: falam de Portugal! Pura ilusão. Estão, mesmo, a falar dos Estados Unidos mas várias das dificuldades são semelhantes às nossas, desde a degradação das instalações e equipamentos das escolas públicas (na realidade, muitas delas, em piores condições que as nossas) até ao mau desempenho nos testes internacionais de matemática, passando pelas questões da violência, da polémica com a integração de grupos problemáticos ou da avaliação de professores.
Repita-se o exercício com competitividade. Ou défice. Os resultados continuarão a evidenciar uma afinidade com o caso português de que, à partida, muito poucos suspeitariam. Significa isso que se devem importar as soluções americanas? Ou que as devamos ignorar? Nem uma coisa, nem outra. Estudar o que é, ou foi, feito noutros países é sempre importante. Desde que não se ignore que o contexto conta: a história, a cultura, os hábitos e costumes, as instituições relevam. E muito. Sobretudo se pretendermos manter um regime democrático que exige a laboriosa construção de soluções negociadas. Queixamo-nos? Veja-se, mais uma vez, o caso americano. Feito, como eles dizem, de "checks and balances", de verificações e equilíbrios. Que obrigam um presidente, com uma maioria absoluta no Congresso e no Senado, a negociar, a ceder, a estabelecer pontes para evitar que a sua proposta de orçamento seja bloqueada por uma minoria de 1/3 dos senadores. Que barulho não se faria por cá se fosse permitida essa minoria de bloqueio...
Profetas alvitrando remédios mágicos escamoteiam (intencionalmente?) que os mesmos só seriam possíveis, no quadro temporal previsto, em regimes absolutistas e subalternizando a vontade popular. Sem dúvida que é uma dificuldade. Acontece que, como dizia Churchill, a democracia é o pior dos regimes, com excepção de todos os outros... Nunca é demais sublinhar isto mesmo, numa altura em que, num extremo e outro do sistema político, começam a emergir discursos redentores feitos de nostalgia desinformada ou de promessas demagógicas. O remédio? Como se diz no frontispício da biblioteca de Bóston: o bem comum requer a educação do povo como a salvaguarda da ordem e liberdade. Ora aí está uma boa lição!