Corpo do artigo
No Douro, na aldeia de meus avós, diziam "reises", o que aos citadinos parecia mau falar. Que não. Nem era errado, mas, tão-só, o modo de expressarem o plural de reis.
Falando dos "reises" no Porto, as notícias mais antigas referem que fechavam o ciclo natalício e, contrariamente ao que se passa agora, seriam emblemáticos. Provavelmente o furor consumista fez eclipsar esta última festividade do Natal. Os reis eram cantados pelas ruas (confundidos com as janeiras, mas de teor diferente) pelos "reiseiros", como loas costumeiras no séc. XVI, já que um autor da época a elas alude desdenhosamente.
Numa, do Burgo, diziam: "Vimos cantar-lhes os reis / Com prazer e alegria / Que nasceu o Deus Menino / Filho da Virgem Maria / Santos Reis coroados / Vinde ver quem vos guiou / Foi a estrelinha do Natal / Quando por aqui passou". Da Maia, vinham os grupos de Reiseiros representar os seus Autos ao Sá da Bandeira, para gáudio da assistência.
Mas a maior originalidade era a existência de um doce do Dia de Reis: o bolo, cuja receita, ao que se sabe, foi trazida de Paris, em 1869, pelo confeiteiro Baltasar Rodrigues Castanheiro Jnr, da Confeitaria Nacional, em Lisboa. Terá chegado ao Porto em 1890 e fabricado, na véspera de Reis, pela Confeitaria Cascais, da Rua de Santo António. Alberto Pimentel até ironizaria dizendo que Lisboa saboreia o "costume francês", e que "nas cidades, Coimbra, Porto, Braga, o Bolo-Rei começa a penetrar por subserviência à capital".
Enfim, quando o Porto consoava três vezes, em 5 de Janeiro festejava a Epifania e, no dia seguinte, com melancolia, acabava o Natal.
* O autor escreve segundo a antiga ortografia