Três mulheres foram mortas nos últimos dois dias por homens às quais estavam ligadas por laços de família. Duas foram assassinadas pelos maridos, uma delas bem jovem e porque queria trabalhar. A terceira foi esfaqueada pelo padrasto, para "acabar com as chatices".
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Já se escreveu muito sobre esta realidade mas cada um destes homicídios é uma vida realmente perdida, uma família destroçada, um desequilíbrio para sempre. Mais do que os números, que são assustadores - no ano passado, morreram 43 e mais 39 foram alvo de tentativas de homicídio por familiares - estão em causa mulheres reais desfeitas por um impulso brutal e inaceitável.
Sabemos que a morte nos toca de maneiras diferentes, conforme a proximidade ou as causas que a provocam. Por vezes é a indignação, como os casos das três mulheres. Pode ser curiosidade, como ac onteceu com os efeitos dos furacões dos últimos dias, nos Estados Unidos e na costa leste do Pacífico. Ambos provocaram dezenas de mortes e deixaram estragos que vão multiplicar-se nos tempos próximos. Pode até ser indiferença, como nos acontece perante as constantes perdas em zonas de guerra. No domingo, um bombista suicida matou 28 pessoas num instante, numa mesquita de Bagdad, e esse facto não causou entre nós mais do que uma vaga sensação de desconforto.
Preferia ter usado este espaço para falar de assuntos festivos, como as flores de papel que transformam esta semana Campo Maior num lugar de maravilha. Ou a alegria do jamaicano Yohan Blake ao vencer os 100 metros na Coreia do Sul. Ou a força obstinada de Zé Pedro dos Xutos a celebrar a vida nos palcos de festivais de Verão. Até podia ser a chegada espampanante de Putin a um encontro de motards à beira do mar Negro. Preferia trazer qualquer coisa com um sorriso cá dentro.
Mas acontece que há algumas horas apareceu a notícia da morte de Fernando Ramôa Ribeiro, este ano reeleito para o cargo de reitor da Universidade Técnica de Lisboa. Recordo a presença discreta, a simplicidade de olhar para a ciência com rigor e devoção, o sentido de missão do dirigente.
E por isso o único sorriso que trago hoje veio das palavras do reitor da Universidade conhecida como "Clássica", António Nóvoa, ao contar a reunião que com ele teve há poucos dias. Ramôa Ribeiro defendeu aí o projecto de união das duas instituições : "Apontou um caminho, quase em jeito de testamento. Tudo faremos para estar à altura da sua vontade".
Não falo aqui da morte dos que nos são mais queridos, dessa dor que nem o tempo pode apaziguar. Falo de outra coisa, menos íntima: as notícias que gostaria de nunca ter lido.