Corpo do artigo
Os avultados contratos que o Benfica, o Porto e o Sporting assinaram com duas operadoras de telecomunicações indiciam uma mudança de paradigma na negociação dos direitos de transmissão dos desafios de futebol e na venda de publicidade. A partir de agora, há outros players a considerar, novas receitas para gerar e distintas formas de consumo dos jogos para reinventar. Convém, pois, que os atores que entram neste jogo encontrem plataformas de diálogo e de partilha de conteúdos. Porque dividir para reinar pode não ser a melhor estratégia.
Os contratos assinados podem surpreender pelas quantias envolvidas. Falamos de verbas que ultrapassam os 400 milhões de euros em cada contrato, mas é preciso sublinhar que o eixo temporal se estende por períodos da ordem dos 10 anos e que cada clube, para além de ceder os direitos televisivos dos jogos em casa, entregou também às operadoras a transmissão e distribuição do respetivo canal que controla no cabo. O Porto e o Sporting negociaram ainda a publicidade estática e virtual nos estádios e nas camisolas dos jogadores. É um negócio em pacote que, embora de grande escala, fica muito aquém do que se pratica nos maiores clubes das ligas inglesa, espanhola ou alemã. Ainda assim, esta é uma oportunidade para abater o passivo, criar uma outra imagem bolsista e ganhar fôlego competitivo dentro de campo.
Neste contexto, outro dado relevante é a entrada de um player cujas jogadas, a partir de agora, comandam todo o processo. Falamos das operadoras de telecomunicações que procuram novos clientes. Felizmente nem a NOS, nem a MEO conseguiram fazer o pleno dos três grandes. Isso significa que vão estar em permanente concorrência, tentando não desiludir potenciais clientes. Mas também é verdade que podem pisar linhas vermelhas. A interrogação que hoje se coloca aos adeptos e telespectadores é dupla. Em primeiro lugar, pergunta-se se será possível acompanhar o campeonato da Primeira Liga, vendo todos ou a maioria dos jogos, a partir de qualquer uma das duas plataformas de cabo. Depois, questiona-se a necessidade de subscrever mais que um canal "premium" para ver os diferentes jogos, algo que acarretaria custos adicionais, provavelmente incomportáveis. A ver.
Mas este negócio não implica apenas pensar de que modo serão agrupados ou divididos os jogos. A entrada das operadoras de telecomunicações vai induzir novas formas de consumo. E isso já germina nas gerações mais novas que, no tempo de vigência destes contratos, serão públicos a disputar com intensidade. Hoje, os jovens não seguem a televisão de modo convencional. Consomem, sobretudo, conteúdos em plataformas móveis e será nesses renovados periféricos que continuarão a estar nos próximos anos. Ora é exatamente aí que este negócio tem de germinar, devendo incorporar estratégias de convergência de ecrãs e de abertura à participação dos utilizadores. Um jogo de futebol será sempre para acompanhar em ecrãs gigantes, que poderão rasgar outras janelas com diferentes ângulos e perspetivas daquilo que se passa dentro do estádio. Mas os dispositivos móveis podem complementar a experiência com o visionamento, na palma da mão, do pormenor do treinador, do jogador, do árbitro ou do público. Ou ainda ser usado para votar no melhor golo, na melhor defesa, na mais inovadora coreografia... Em tudo isto há uma constante, que só por si explica a entrada das operadoras. Falo do potencial de gerar tráfego de comunicações e, portanto, de alimentar o negócio "core" destas empresas.
Os contratos dos direitos de transmissão perdurarão até perto do final da próxima década. Ninguém arriscará prognósticos quanto ao relacionamento das operadoras, ao desenho do panorama audiovisual, à vitalidade do mercado publicitário e aos novos conteúdos e consumos multimédia que se vão gerando. Apenas sabemos que falamos de uma realidade bem diferente daquela que temos e nela pode caber tudo. E isso é fascinante. Porque nos abre um mundo novo de enormes potencialidades de ver a realidade e de nos relacionarmos uns com os outros.
É, pois, com este registo de otimismo no futuro que desejo a todos um excelente 2016.
Prof. associada com agregação da UMinho