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Eram bem para cima de um milhão, dizem poderem ter sido dois milhões. Para o que mais interessa, interessa pouco. No Dia da Catalunha, eram tantos nas ruas que a estética avassaladora da imagem e do som lançou um grito político que até se cravaria em metal. Pois a diferença maior em relação aos anos anteriores era uma nova circunstância: na manifestação de sexta estaria ao engano quem não fosse a favor da independência. Aliás, a encabeçar aquela mole imensa estavam os líderes do movimento "Juntos pelo Sim", que vão a jogo como favoritos nas eleições antecipadas de 27 de setembro para o Parlamento catalão.
Estão à frente nas sondagens, anunciam a "consulta definitiva": quem votar neles quererá que deem o passo sem retorno. Os opositores, claro, dizem o contrário. Por isso o jogo do "Juntos pelo Sim" é de risco duplo.
Se tiverem a maioria dos deputados no Parlamento catalão, quererão de vez a independência, e aqueles que se lhes opõem dirão que lhes falha legitimidade para tal. Se perderem as eleições, que Deus lhes acuda. Serão destroçados politicamente, morre ou ficará em dormência prolongada o sonho da independência. E os seus opositores gritarão, dando o dito por não dito, que as eleições autonómicas eram afinal a consulta final e tinham demonstrado que a Catalunha será espanhola até ao fim dos tempos, Ámen.
Voltemos à manifestação brutal de sexta-feira.
Soraya Sáenz, vice-presidente do Governo espanhol, compreendeu de forma límpida a sua importância mas, sob o efeito da cólera, despiu-se. Reconheceu a enorme prova de força daqueles que detesta quando disse que os independentistas tinham capturado aquilo que era de todos os catalães e não só daqueles que já não querem Espanha. Tem razão. Mas, politicamente, não consegue responder a duas observações simples. A primeira, porque não houve uma manifestação paralela anti-independência. A segunda, se aqueles eram os pró-independência... caramba, eram muitos!
Bom, só para acabar com o mais importante. Isto da "política" é muito bonito, mas não esqueçam o Barça. Com todas estas andanças e contradanças, seria crime de irredutível lesa-arte que o Barça pudesse ficar sem adversários à altura. Se for esse o caso, catalães, sigam o meu conselho: anexem Madrid e concedam-lhe estatuto autonómico. Ficam com o Real e o Atlético.
*PROFESSOR UNIVERSITÁRIO