Estava escrito nas estrelas: Rui Moreira e Manuel Pizarro tinham um acordo tácito que os empurrava para a junção de forças, caso um deles vencesse, sem maioria absoluta, a corrida à Câmara do Porto. O acordo ganhou corpo durante a campanha e passou agora a forma de letra. Quem ganha e quem perde com a concretização do que estava escrito nas estrelas?
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A distribuição de pelouros é uma vitória em toda a linha para Manuel Pizarro. Tomar conta da Habitação, da Ação Social e do Urbanismo corresponde a tomar em mãos áreas essenciais do desenho programático que ajudou Rui Moreira a vencer as eleições. Por outro lado, ao atribuir tamanhas responsabilidades aos vereadores socialistas, Rui Moreira amarra-os durante quatro anos, na medida em que a boa execução dos planos em cada uma das áreas exige cumplicidade máxima entre os parceiros.
É exatamente este espartilho que a Distrital do Porto do PS rejeita. José Luís Carneiro preferia um mero acordo de princípios. Sucede que acordos de geometria variável costumam esboroar-se em muito pouco tempo. Estar de bem com Deus e com o Diabo em função das circunstâncias não é grande maneira de fazer política. Ou se está ou não se está: para o bem ou para o mal, Pizarro decidiu estar, impondo a sua decisão à Distrital.
Há, a meu ver, um outro e não menos relevante motivo para esta opção de Manuel Pizarro. O PS está fora do Poder na cidade há 12 anos: e arrisca-se a estar outros 12. Ora, a malha mais fina dos interesses dos partidos (aqueles que se jogam nas juntas e nas assembleias de freguesia) e a malha intermédia dos interesses (aqueles que se jogam nas empresas municipais e congéneres) não suportam duas décadas sem acesso a pequenas e médias benesses. Ao assinar o acordo, Pizarro garante que o PS faz parte do aparelho de Poder no Porto, garante que as estruturas socialistas não definham e garante, por fim, uma base de apoio que lhe dará jeito mais lá para a frente.
E Rui Moreira no meio disto? O presidente da Câmara garante estabilidade no Executivo, é certo. Tenho a certeza de que rubricou o acordo julgando ser essa a melhor forma de gerir a cidade. Se for, Moreira pode bem chegar ao final do mandato e "obrigar" o PS a apoiá-lo. Se as coisas correrem bem, que sentido faz não repetir a dose? Sobra um problema: ao escolher Moreira, os eleitores pediram-lhe que evitasse os jogos partidários, que os transcendesse, que passasse por cima deles. O novo presidente sabe que as expectativas em relação ao seu mandato estão muito altas. No Porto e fora dele. Entenderão esses mesmos eleitores que a primeira medida de Moreira seja estabelecer um acordo partidário?
A pergunta que se faz no título deste texto precisa de amadurecer para ter resposta certa. Creio, contudo, que Rui Moreira tinha condições para governar em minoria. A expressão local e nacional da sua vitória colocou-o num tal estado de graça, que seria muito difícil à Oposição fazer-lhe a vida negra apenas porque sim: quanto mais os partidos lhe barrassem o caminho, mais Moreira se aproximaria de uma próxima maioria absoluta. Bastaria para isso que o novo presidente se mantivesse firme nos propósitos e não cometesse erros sérios.