O ex-primeiro-ministro tem feito tudo para travar o andamento do processo. Com imaginação, dinheiro e bons advogados, conseguiu colocar uma parte do jogo onde desejava - o país já não quer saber o que se passa e as acusações de que é alvo. O tempo da nossa atenção passou há muito, as reportagens já não prendem e até o livro de João Miguel Tavares venderá menos edições do que merece. Sócrates é irritante, arrogante, petulante e impante no seu modo de fazer parecer que toda a gente é burra, inferior, menor. Mas de atraso em atraso, de recurso em recurso, de manobra em manobra, tem exposto a fragilidade da Justiça portuguesa e isso é tão relevante como a convicção generalizada da sua culpa. Só que o pecado não mora apenas ao lado de Sócrates. No rescaldo do abandono de Pedro Delille, o tribunal nomeou um defensor oficioso, o advogado José Manuel Ramos. A escolha não foi inocente, mas uma provocação da qual espero que estejam arrependidos. Escolher um advogado cego, amparado por uma senhora de idade e notoriamente fora do contexto, foi de uma crueldade dispensável. Aquela pessoa não foi protegida de um circo mediático que, estava mais do que na cara, o iria humilhar no que tinha de mais sagrado, a sua reputação. Os juízes não podem brincar com a vida de uma pessoa apenas para "picar" Sócrates e gozar o prato. Imagino que a tentação de o fazer possa ser grande, mas José Manuel Ramos deveria ter sido protegido, até de si próprio, e não mandado aos leões como se estivéssemos numa arena de gladiadores em Roma.
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