À segunda foi de vez. É comum dizer-se que não há duas sem três, mas Rui Rio é um corredor de fundo marcado por excessivas flechas em cada traçado de percurso.
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Em quatro anos de liderança partidária, já conta com demasiados "sprints" nas pernas. Rio não deverá ser chamado a uma terceira vitória "in extremis" no PSD, após derrotar Montenegro (há quase dois anos) por uma diferença de pouco mais de 2000 votos e de, nas directas de sábado passado, ter celebrado no esplendor do "photo finish". Partindo bem atrás na corrida, Rio resistiu e ganhou a liderança na recta final por curtos, mas decisivos, 52%. Com 2% de diferença em carteira para Paulo Rangel e baronato, o renovado líder do PSD não pode ter ilusões sobre a voracidade da oposição interna caso perca as eleições legislativas ou se não conseguir acertar um novo Bloco Central com António Costa. Venceu Santana Lopes, Luís Montenegro e Paulo Rangel. Obra de líder. Mas a divisão interna no PSD solidificou-se entre duas trincheiras e a Rui Rio não será dada uma quarta oportunidade para causar uma boa terceira impressão.
Audácia. Permanentemente acossado por uma maré de descrença que antevia ausência de corrente, Rio teve a inegável coragem de se afirmar teimosamente entre os seus pares. Foi ao encontro do que o seu eleitorado quis ouvir e, agora, em lançamento para as legislativas, teve a sorte de ter um afluente chamado Rangel a engrossar o caudal. Legitimado, relegitimado, uma e outra vez, vencedor de todos os combates internos, Rui Rio entra para a campanha eleitoral mais fortalecido do que nunca. Eis um Congresso cujo destino foi alterado pela mão do homem. Entre 14 e 16 de Janeiro, a rampa de lançamento prevista para um eurodeputado será a glorificação de um proscrito, homem antes incapaz de vencer eleições nacionais, mas que todos quererão saudar como futuro primeiro-ministro num prazo de 15 dias.
Veremos o que António Costa pretende fazer com a sorte. Caso, como é previsível, vença as eleições sem maioria, a Costa será entregue um par de opções, bem distintas, que muito dirão sobre o futuro da governabilidade e sobre o seu posicionamento e durabilidade na liderança do PS. Se olhar à Esquerda, verá anteriores parceiros de coligações informais, determinados a negociar o que antes nunca verdadeiramente esteve em cima da mesa das negociações. A opção de olhar à Direita para o PSD de Rui Rio só acontecerá à boleia do fim da linha da táctica e através de uma convicção ideológica arrevesada. Tentador. Se não abrir a porta do Bloco Central a Rui Rio, António Costa sabe que pode estar a condenar o PSD a mais dois anos de luta interna sem tréguas, afundando o maior partido da oposição num desgaste do qual dificilmente sobreviverá tal e qual o conhecemos. Terá a palavra o primeiro-ministro ou o líder do Partido Socialista?
o autor escreve segundo a antiga ortografia
*Músico e jurista