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E 2015 já vem vindo radioso. Com um sol que desmente a névoa que se abate sobre o que por aí vem.Por exemplo, a economia ainda se apresenta desfocada. A produtividade económica do nosso país ainda está presa em muitos entraves que a não deixam crescer o suficiente para darmos o salto de crescimento de que precisamos. Demasiado peso dos setores não concorrenciais, estímulos demasiado complexos para poderem alavancar rapidamente os esforços de saneamento ou de crescimento das nossas PME, uma formação desgarrada das necessidades, uma capacidade de exportação ainda muito limitada por uma base empresarial muito estreita.
E o que mais preocupa é pensar que uma baixa continuada do preço do petróleo pode afetar de tal maneira a capacidade económica dos nossos principais parceiros comerciais que até o famigerado motor da nossa recuperação possa pura e simplesmente gripar.
A formação de expectativas positivas sobre a evolução do nosso ambiente empresarial e financeiro continuará ensombrada pelos casos de 2014. Por mais comissões de inquérito, ações judiciais ou outros fumeiros do género, não me parece que em 2015 se venha a descortinar com a meridiana limpidez que se exige, o que de facto aconteceu e, mais importante, o que entretanto se organizou para que nada de semelhante se venha a repetir.
E, por mim, confesso que não ajuda ao processo de clarificação a despudorada publicitação de reuniões internas de um grupo empresarial, por mais criminoso que seja o seu conteúdo. Este é um levantar da cortina que devemos dispensar. A justiça à justiça. Até porque ninguém precisará deste constrangedor embate para ter a noção do grau de irregularidades olimpicamente cometidas. Mas todos, julgo, ficamos com a ideia de que se abriu um perigosíssimo precedente. Tudo, claro, dentro da total liberdade editorial que assiste aos diretores de informação dos vários media.
Mas vamos à política! Essa então, das duas uma, ou parece coberta de neblina ou é tão evidente que até enerva.
António Costa faz-se de D. Sebastião enquanto, debaixo do nosso nariz, abre às escâncaras as portas a Rui Rio e a um outro PSD. O outro PSD faz o número do "a seu tempo" mas deve estar a rezar para que o dito acabe. O CDS, claro, está como sempre - uma espécie de morto vivo que só acorda quando espeta a faca. À esquerda, a mesma neblina clara como a neve. Protestos de capacidade executiva de um PCP que sabe que só se aguenta enquanto for tão imóvel e imortal como a múmia de Lenine, e o BE, esse tão fatiado que não precisa de se esfumar. Não se vê!
Mais perigoso, no entanto, é o arrepiante rastejar camuflado dos partidos extremistas europeus que ameaçam ou controlar ou definitivamente alterar a contabilidade dos votos na Grécia, em França, em Espanha ou no Reino Unido. Em 2015 rasgarão a névoa e aparecerão triunfantes os UKIP, os Syriza, a Frente Nacional ou o Podemos. Sem sombra da excitação com que todos acompanhamos um outro Podemos (yes, we can).
Eu sei que parece lugar-comum, mas talvez nunca seja demais relembrar que foi também de uma espessa neblina que o partido nazi apareceu arrastando a conservadora classe média alemã.
Isto numa Europa que parece uma casa assente em paliçadas mais fininhas do que as pernas da Olivia Palito e de onde tudo se atira à água ao primeiro sinal de fogo. E o vento vai continuar a soprar de sul para norte.
Há de ser essa Europa enevoada que nos vai trazer mais recados da troika e nos há de impor mais este ou aquele aperto. Vamos ter ainda mais dificuldade em descortinar para que servem e que efeitos terão porque aparecerão louvados ou renegados por discursos eles próprios envoltos no fumo próprio dos discursos eleitorais.
Eleições essas que quase só na véspera deixarão descortinar os candidatos à Presidência da República. Que vaga de fundo espera António Guterres? Quem estará, afinal, no último momento, por detrás da cortina do lado do PSD?
Soprar o nevoeiro, que é como quem diz, ganhar distância e procurar conhecer melhor o que nos rodeia, é afinal o que desejo, a bem de uma sociedade mais esclarecida. E mais ativa.
Feliz 2015.