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Carlos Costa vai para um segundo mandato como governador do Banco de Portugal. É pena que tal aconteça debaixo do fogo da guerrilha de campanário, já em plena pré-campanha eleitoral, e sem que, da parte do Governo, tenha havido o esforço para um mínimo entendimento parlamentar relativamente à sua recondução.
Pode, até, argumentar-se que outros governos fizeram o mesmo no passado. E fizeram. Mas tal revela que se aprendeu pouco nestes anos, em especial com os desastres financeiros que ocorreram, por todo o lado, debaixo do nariz da supervisão bancária.
A função de governador do Banco de Portugal, cujo estatuto é independente do Poder Político, é demasiado importante para ser jogada no terreno da querela eleitoral. A forma como o Governo decidiu a recondução de Carlos Costa fragiliza, pois, o seu novo mandato.
É fácil, hoje, depois da hecatombe do BES, e de todas as revelações conhecidas por via do inquérito parlamentar, apontar erros e omissões à forma como o Banco de Portugal exerceu a supervisão. Eis a cicatriz que marca indelevelmente o primeiro mandato deste governador. Mas não foi Carlos Costa que geriu o BES!
Alguns dos que o querem transformar no bode expiatório de todos os pecados do sistema financeiro são os mesmos que só no final do processo BES/Novo Banco vieram propor soluções legais para conferir ao governador os poderes que lhe faltaram para que a tal regulação que lhe exigiam possa agora ser mais eficaz.
Carlos Costa é um homem sério, de carreira sólida. Trocou a vice-presidência do Banco Europeu de Investimentos pelo Banco de Portugal. Suportou a pressão, sem exemplo entre pares e sem precedentes, num setor minado pela crise e que ameaçava contaminar toda a economia. Serviu de escudo ao Governo, e até ao presidente da República, em momentos de hesitação, ou perante indecisões, medos e cumplicidades. E arriscou, de forma competente, a primeira resolução de um banco português.
Nas mãos de Carlos Costa está a condução da venda do Novo Banco. E, mais importante, compete-lhe garantir a independência do Banco de Portugal e restituir aos cidadãos a credibilidade no nosso sistema financeiro. Mas, por muito tempo, Carlos Costa, que fez de bola vermelha no bilhar, apanhando pancada de todos os lados, vai engolir o fel para salvar a face do regime. Porque a crise do BES é, afinal, a crise da política portuguesa. Que também é moral, como está bem de ver.