O GOVERNO TARDA em passar das intenções ao efectivo corte da despesa do Estado. Convém um emagrecimento rápido, ainda que sem o final da conhecida história do asno...
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A história é famosa e tem por protagonista um burro. Atribuem-na a um inglês embora, nunca como agora, exista a séria hipótese de o quadrúpede vir a ser identificado como de posse portuguesa. No essencial do romanceado, o animal estava gordo, muito gordo, e o dono resolveu fazer-lhe uma cura de emagrecimento. Optou por lhe ir cortando a alimentação aos poucos, só que quando o anafado estava a ficar esbeltíssimo deu-se o inevitável: o burro morreu!
Ora, a história do burro assenta como uma luva ao actual Estado português.
Durante anos, o processo de engorda estatal resultou num corpo de tal modo disforme que acabou por ficar conhecido por "monstro". Deu no que deu.
E agora?
Não há volta a dar: urge recompor uma figura atinada, isto é, um Estado mais magro. O diagnóstico está feito e o segredo reside na melhor medicação a aplicar.
Para o bem e para o mal, o receituário fundamental está firmado com a assinatura imposta pelo triunvirato FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia aos partidos fadados para o Poder português. Os problemas derivam, porém, da capacidade de saber dosear os remédios sugeridos.
Os primeiros meses de aplicação do acordo subscrito com a troika resultam, até ver, num paradoxo. A par de um processo vitamínico socialmente insensível (leia-se a tendência para a obtenção de mais receitas, indo ao bolso dos contribuintes que já nada têm ou para lá caminham pelo minguar de uma rarefeita classe média), o Governo tem adiado decisões sobre cortes na despesa - ainda que os partidos da coligação tivessem garantido na oposição e na campanha eleitoral disporem de uma cartilha pronta a aplicar. O resultado aponta, até ver, num naipe casuístico e sem significado nos custos e num mero processo de intenções a concretizar em próximo orçamento do Estado. Ou seja: o "animal" continua gordo.
Embora o primeiro-ministro mantenha na linha de horizonte o corte na despesa, os bem-intencionados não deixarão de considerar estar Passos Coelho a ponderar a melhor forma de proceder a um emagrecimento do Estado que cuide de não acabar nos padrões do tratador do célebre burro que acabou por morrer. Será, evidentemente, uma perspectiva cândida, tanto mais quanto mais tarde ou mais cedo os cheques pré-datados da ajuda da troika acabarão por funcionar como uma espécie de cenoura...
Sejam quais forem os argumentos, há um dado adquirido: justifica-se a impaciência dos portugueses; percebe-se que exijam a aplicação de uma receita de emagrecimento do Estado, a qual já tarda. Ainda que o pôr fim ao despesismo de um Estado em muitos casos sumptuário não desaconselhe a urgência de redefinição das suas competências, descartando o que tem a mais - e muito é.
É fundamental, pois, balançar (dosear) uma série de decisões. Convém que o burro não morra à fome, mas também é fundamental rodeá-lo de mecanismos que o impeçam, depois de ficar com peso razoável, de voltar à engorda numa primeira distracção. Seria a dieta ioiô.