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Repito. O sr. João Galamba não possuía, nem possui, perfil moral ou político para ser ministro da República. Se ele se mantém, a responsabilidade política, ou outra, deixa de ser dele e cai, por inteiro, nas mãos do primeiro-ministro. Ele, o sr. Galamba e porventura algum outro encenador de serviço ao PS e ao Governo engendraram durante algumas horas uma pequena farsa que terminou com Costa a rejeitar o "pedido de demissão" do sujeito, e a enfrentar Marcelo, que o queria demitido. Tal obrigou Marcelo a falar ao país para, ao fim de penosos seis anos de cumplicidades despropositadas, pôr termo à "capacidade, confiabilidade, credibilidade, respeitabilidade, autoridade, confiança, respeito e responsabilidade" que, pelos vistos, encontrava no Governo. Usou a criatura Galamba como homem de palha. Desvertebrou-o ainda mais, atestou-o de morto-vivo, enquanto, na verdade, descrevia o Governo, em geral, e o primeiro-ministro, em especial, de quem deve estar muito adequadamente farto. A isto, e com a proverbial lata e falta de vergonha política que o caracterizam, Costa respondeu como Salazar: todos não somos de mais para vigiar o Governo. Tem razão. Um Governo que usa dubitativamente os serviços de informações da República - ou uns serviços de informações da República que se deixam usar dubitativamente pelo Governo - é um Governo que tem de estar sob escrutínio público permanente. Um Governo que, a cada dia que passa, se revela em sentido contrário ao apontado pelo presidente, como incapaz, não confiável, não credível, não respeitável, desprovido de autoridade e a abundar em autoritarismo estéril, irresponsável, nomeadamente no tema TAP, como se vem constatando em sede de comissão parlamentar de inquérito, deve ser atentamente vigiado. O paradoxo deste episódio (que é já um contínuo) é que Costa, ao segurar o sr. Galamba com as duas mãos, perdeu a mão num Governo onde já não tinha muita. Aquela gente, se já era timorata ou nula, daqui em diante hesitará em dar um passo sem olhar por cima do ombro e para o chefe. Com a sua bravata, o primeiro-ministro açambarcou todas as pastas. O que de bem e de mal suceder no país, todas as acções e omissões do mais remoto ajudante governativo, as do novo morto-vivo incluídas, lhe serão evidentemente assacadas. Passou, nas palavras de Marcelo, a existir uma "diferença de fundo". De um lado está o país, maioritariamente com o presidente. Do outro, para servir o país sem desculpas, o Governo de um homem cada vez mais só chamado António Costa. É a vida, como dizia o outro.
o autor escreve segundo a antiga ortografia
Jurista