Por esta altura já muitos terão a impressão de que a jovem Greta Thunberg é das poucas pessoas adultas do planeta. Com tanta desdita sobre a sua pessoa, quem ainda não entendeu a desgraça australiana precisa de regressar à infância e educar-se outra vez.
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A influência do ser humano nos ciclos do planeta é retumbante. Em 100 anos degradámos o que uma eternidade levou a depurar. Tornamo-nos arrogantes e nocivos, porque nos recusamos a adequar a informação conquistada à conduta que levamos. Curioso como a incúria mundial espalha a ideia de que tudo é uma questão de opinião. Não é assim. Quando somos operados às cataratas não discutimos com o médico como achamos que ele deve cortar. Não dizemos aos engenheiros quantos pilares e traves devem ter as nossas casas, como se deita uma laje. Não sabemos como sombrear um corpo numa pintura, a pintura parece tantas vezes um absoluto milagre. Contudo, no que respeita às alterações climáticas, como treinadores de sofá, abundam conspirações e convicções de fé.
O aquecimento global deixará sempre em perigo os grandes territórios secos. A vegetação que resiste em lugares assim sucumbirá à avidez de qualquer fogo. É elementar. Julgar que Trump ou Bolsonaro nos diriam alguma verdade, eufóricos na depredação do planeta em prol de um lucro ilimitado, é viver em delírio. A ciência, com as suas tentativas e erros, é absolutamente o único caminho possível. O único modo de se descortinar como nos desenvolver sem caminhar para o abismo.
Importa, por isso, voltar a construir uma mentalidade de verificação. A cada um e a todos nós compete o abate da bárbara cultura do boato. Temos de ser implacáveis com veículos de propaganda, emissores despreparados, irresponsáveis, agitadores levianos que propõem, por interesse maligno ou simples estupidez, a divulgação da mentira que acaba por instalar a indiferença, gerada pelo impotente de nos sentirmos sem mais saber em que confiar.
Namoramos o fim por não havermos sabido ser de confiança e confiar. A Austrália ostenta hoje a cicatriz mais horrenda da nossa leviandade sobretudo moral. Há 30 anos que nos avisam acerca do que está a acontecer. Há 30 anos que toleramos políticos, empregadores, colegas no café que, malignos ou estúpidos, nos levam a todos mais perto do fim.
Espero que estejam os adolescentes de hoje mais bravos do que nunca, inspirados por essa menina que nos deveria educar a todos, de modo a que se reverta o que ainda for possível reverter. Por respeito ao futuro. Essa coisa que diminui a passos largos.
*Escritor