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Selecionar implica escolher uma parte do todo recorrendo a um ou mais critérios. É o que fazemos, afinal, em quase todos os momentos da vida, quando comemos, quando "somos" de um clube e não de um qualquer dos outros, quando nos apaixonamos, quando escolhemos este meio de transporte em vez daquele, quando acreditamos em Deus ou não acreditamos ou quando escolhemos que essa opção nos é indiferente.
Olhando para este ano de 2014 que agora começa a parecer velho e cheio de rugas, cada um terá a sua escolha sobre aquilo que considera como de maior relevo, se também isso não lhe for indiferente e não preferir adotar, pura e simplesmente, o velho princípio de que a um dia se segue outro e assim por diante, até estarmos todos mortos.
A ter que optar, escolho à bruta um critério, o do "não". Tem uma vantagem, obriga a estacar por um instante e a tomar nota daquilo que nos indignou, que nos emocionou ou comoveu...mas que logo esquecemos, cada vez mais parecidos que estamos com os peixes ou pelo menos com aquele que era amigo do Nemo dos desenhos animados.
Por exemplo, ainda não sabemos, de todo, o que aconteceu ao avião malaio, assim como à respetiva tripulação e passageiros que se sumiram por um passe de terrível mágica. No século XXI, este século da tecnologia infalível e perfeita em que, se perdermos um euro, chama-se um satélite que o encontra logo, um mastodonte carregado de tecnologia desapareceu, outros mastodontes de tecnologia (da tecnologia mais avançada, se fazem o favor) foram lançados em sua busca...e nada, népias, nicles. Nunca mais apareceu, e já ninguém gasta um segundo a pensar nisso.
Mudemos de assunto, para desanuviar. Lembram-se das jovens e crianças que foram raptadas na Nigéria pelo Boko Haram, aquele movimento de que ninguém tinha ouvido falar e de que ficámos especialistas em poucos dias? Aquelas que levaram a uma campanha internacional que exigia a sua libertação? A maioria ainda não foi libertada. E o Boko Haram teve um ano de 2014 em grande. Pois é.
Querem outro "não"? De facto não sabemos quem realmente derrubou um avião, também ele malaio, por cima da Ucrânia. Com base em indícios fortes, condenámos os rebeldes na Ucrânia, condenámos indiretamente a Rússia (eu condenei) e foi tomada a decisão de a sancionar ainda mais. Mas......Mas, afinal, a análise dos destroços da aeronave por uma equipa de peritos internacionais e o seu relatório preliminar não são nada categóricos sobre o assunto (muito antes pelo contrário), e logo caiu um manto de silêncio sobre o assunto, ou um rápido assobiar para o lado. Portanto, e repito, ignoramos quem derrubou o avião e assim causou a morte de todos os seus passageiros e tripulantes.
Também ainda não é desta que a União Europeia manda para o passado a crise que a tem corroído. Escolheu Juncker, de uma forma que aproximou o processo da democracia representativa. E logo Juncker derrapou numa escandaleira fiscal do tempo em que foi primeiro-ministro. Também, já é azar.
Acrise financeira causou-nos mossa, e da pesada. No entanto, para além das mossas no bolso, no emprego e na esperança, a mossa principal é a que vai para lá do dinheiro: é a mossa nas ideias e, sobretudo, nos ideais. A União Europeia, essa União com que tantos sonhámos, era afinal uma daquelas coisas que só funcionam "para o bem". Realmente, quando alguns começaram a tossir a sério, logo os saudáveis se puseram a milhas e a única coisa que souberam dizer foi "eu bem te tinha dito que não fumasses, agora trata da tua vida!". Depois, como o risco começava a atingir todos, assistimos a um "amorzinho, cá estou eu, fui só às compras!". Mas a ferida ficou, e vai demorar a sarar. A verdade é que, se não tiver cuidado e arrepiar caminho, a União Europeia estará cada vez mais parecida, enquanto "sistema", com os anos de chumbo da antiga "democracia-cristã" italiana. Que não deu em grande coisa.
Que diabo, até ficava mal se não acabasse com dois "sins". Sim, o restabelecimento de relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba é uma grande notícia. E a "minha" grande notícia é o Boavista de regresso à Primeira Liga.
Não, a injustiça e a patifaria não ganham sempre. Sim, às vezes vale a pena teimar. É assim mesmo: o "não" só faz sentido porque existe o "sim".