Corpo do artigo
A inenarrável história de Miguel Arruda, o deputado do Chega que ninguém conhecia mas que hoje é o mais famoso parlamentar português nas redes sociais e nos aeroportos, não se esgota no ridículo. Ainda que, a cada revelação, vá sendo possível testar os limites do nosso espanto. Um eleito da nação suspeito de furtar malas de viagem das passadeiras rolantes no trajeto entre os Açores e o Parlamento e que, não satisfeito, terá tentado vender o recheio na Vinted não é apenas uma anedota nacional. É a forma mais divertidamente eloquente de a moralidade que o partido de André Ventura apregoa aos sete ventos lhe cair direitinha na testa política.
E de nada lhe adianta reagir com rapidez e pulso para expiar o demónio insular, criando uma cerca sanitária sobre Miguel Arruda (atirado para a última fila do hemiciclo e agora de “baixa psicológica”). Com isto, o Chega provou que é igualzinho aos partidos que despreza. E provou, sobretudo, que, com exceção de meia dúzia de parlamentares que se revezam nas televisões, os restantes são poupados ao palco por razões óbvias. De resto, só nos podemos admirar com o facto de o país ter demorado tanto tempo a perceber que a terceira maior força política tenha gente com tanta bagagem quanto Miguel Arruda.
O que ficará de tudo isto? Pouco. Quase nada. O deputado desvinculou-se do partido, passou a ter mais regalias (só uma acusação o pode afastar) e o Chega transformará um exemplo de vergonha institucional numa lição tosca sobre probidade, ética e sentido de responsabilidade. Não se admirem se, um dia destes, virem um vídeo no TikTok com uma dancinha de André Ventura e de Rita Matias a gozar com o agora proscrito.