<p>O Conselho Superior de Magistratura informou ontem que o juiz de instrução criminal de Aveiro António Costa Gomes comunicou que é falsa a notícia veiculada pela Comunicação Social no passado fim-de-semana, segundo a qual aquele juiz se teria recusado a cumprir a decisão do presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) no âmbito do chamado processo "Face Oculta".</p>
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Quer isto dizer que, neste momento, as escutas que o presidente do Supremo mandou destruir podem já estar destruídas. E quer isto dizer também que o leitor deve esquecer tudo quanto leu e ouviu desde o fim-de-semana sobre as consequências de o juiz de Aveiro se ter recusado a destruir as escutas. E subindo um degrau mais, quer isto ainda dizer que muitos agentes da Justiça que comentaram tal recusa perderam boa oportunidade de ficar calados, ainda que possam agora dizer que se pronunciaram em tese. Pois.
Acima de tudo, há em tudo isto muitas coisas a lamentar. A primeira delas é que possa ter passado pela cabeça de alguém, seja ele quem for, colher frutos promovendo fugas de informação para os jornais. Não é novo, mas é sempre preocupante. A segunda lamentação a fazer tem a ver com a Justiça: o procurador deveria, a partir das primeiras fugas, ter chamado a si algumas explicações sobre o processo. Essas explicações não travariam, certamente, as fugas de informação, mas esclareceriam a opinião pública. Claro que seria preciso que o procurador tivesse a seu lado alguém capaz de se exprimir em português corrente, pois a linguagem que o procurador usou nos seus dois comunicados é inacessível mesmo a alguns conhecedores do Direito e gera ela própria alguns equívocos..
Num momento em que a única certeza sobre a "Face Oculta" reside em saber-se que o que foi escutado a Sócrates não é relevante nem para o procurador nem para o presidente do Supremo, não faltam vozes, algumas bem insuspeitas, a incentivar os jornalistas à publicação dessas escutas, se as obtiverem. Pois bem: se formos adeptos da justiça popular e não acreditarmos no Estado de Direito e nas suas hierarquias, o que se deve fazer é publicar as escutas em que Sócrates foi acidentalmente apanhado - não é ele o arguido - e que já foram consideradas pelo procurador e pelo presidente do Supremo como nulas. Publicá-las é dizer ao povo que seja o juiz. Onde está o superior interesse público de uma coisas dessas? O conteúdo das escutas, se alguém as obtiver, só pode ser relevante se por elas se aferir que quer o procurador quer o presidente do Supremo protegeram Sócrates da prática de um crime e aí, além de um criminoso, passaríamos a ter três. Alguém acredita? Sejamos claros: a publicação das escutas só interessa a quem interessar a politização das escutas, a quem quiser que se conheçam os pormenores picantes de uma conversa privada para desacreditar politicamente os intervenientes. Que alguns políticos caiam nessa tentação é triste. Que agentes da Justiça o sugiram é mesmo muito preocupante.