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A Grécia vai acordar esta segunda-feira suspensa. À espera de uma decisão judicial e das conclusões de uma reunião entre os três partidos da coligação no poder em Atenas que poderão encurralar ainda mais o país no labirinto de instabilidade de onde parece não conseguir sair. Tudo porque o Supremo Tribunal Administrativo deverá tomar posição sobre o abrupto encerramento da empresa pública de rádio e televisão grega (ERT) materializada pelo Governo sem aviso prévio na passada semana.
O fecho da ERT será tema único da reunião crítica que o primeiro-ministro, da conservadora Nova Democracia, vai manter com os dois parceiros de coligação (Pasok e Esquerda Democrática), que já se opuseram publicamente à drástica medida de Antonis Samaras. É que a decisão não deixou apenas a Grécia no papel de único país da União Europeia sem serviço público de rádio e televisão e ameaça de despedimento a quase totalidade dos seus 2600 trabalhadores. Ela abriu uma brecha no Governo de coligação que pode acabar numa crise política que seria dramática para o país, mas serviria na perfeição as ambições de Samaras. A Nova Democracia tem aparecido à frente nas intenções de voto e, caso a Grécia fosse atirada para eleições antecipadas, o Pasok e a Esquerda Democrática manter-se-iam no limbo político onde se encontram desde a última ida às urnas. À espreita continua o Syriza, principal partido da Oposição que, também para hoje, tem agendada uma grande manifestação na principal praça de Atenas mas que, segundo as sondagens, ainda não pode pensar em disputar o poder. O que significa na prática que uma crise nesta altura se arriscaria a não alterar substancialmente o xadrez político. Talvez por isso, ainda esta semana, o editorialista do diário "Kathimerini" lembrava que "o único caminho para o trio governamental, assim como para a nação, é o caminho da estabilidade e da determinação".
Determinado parece Samaras na sua decisão de manter encerrada a ERT, estação que pretende substituir por um canal mais pequeno e, diz, mais moderno. Os detratores da ideia dizem outra coisa: a intenção é ter um canal ainda mais controlado pelo Governo e as restrições orçamentais impostas pela troika dariam a Samaras o álibi perfeito.
Partidários ou opositores do fecho da ERT, todos parecem concordar com a inevitabilidade de reestruturar a empresa. Diz quem ouve e vê as suas emissões, cuja lealdade aos poderes de cada momento é histórica, e percebe quem transpõe a porta de entrada no edifício-sede da televisão na avenida Mesogeion. Um espaço envelhecido pelo tempo, com equipamentos razoavelmente obsoletos, estúdios a fazer lembrar uma TV pirata ou uma redação a necessitar há muito de um lifting. Uma empresa a quem os poderes, todos eles, pouco têm dado mas a quem tudo têm pedido, sobretudo subserviência e favores noticiosos.
Acontece que a ERT é bem mais do que um antro de jornalistas justa ou injustamente travestidos de comissários políticos. É também a casa que leva a informação e o entretenimento às casas de tantos gregos isolados em ilhas onde os media privados não chegam. E é lá também que está instalada a principal orquestra sinfónica grega que, tal como a rádio e a televisão, Samaras mandou calar. É, por tudo isto, uma segunda-feira decisiva. Para a Grécia, mas, sobretudo, para a democracia e para a liberdade de imprensa. Valores preciosos que tanto deveríamos preservar.