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Com um pouco mais de suspense do que o previsto, PS e PSD chegaram a um acordo que permite viabilizar o Orçamento. Necessário para evitar o disparar do custo de financiamento da dívida pública não é, só por si, suficiente, por duas ordens de razões, ambas invocadas, por antecipação, pelo governador do Banco de Portugal.
Falta uma perspectiva de médio prazo que vá para além da lógica financeira e coloque o crescimento e o combate ao desemprego como prioridades: neste sentido, tenho dificuldade em perceber por que não foi discutida a descida da TSU para quem criasse emprego por contratação de desempregados. Falta, igualmente, a garantia de que não se repita o que aconteceu, por exemplo com o PEC 2, em que a prática foi bem pior do que a teoria: daí a proposta da agência independente para acompanhar a execução orçamental. Pela postura que adoptou nas negociações, Teixeira dos Santos parece empenhado em corrigir o tiro.
Veremos se a máquina do Estado não lhe escapa, mais uma vez, ao controlo. Os sinais não são animadores e não falo da greve geral já convocada nem da postura dos magistrados do Ministério Público que se acham discriminados por no sector privado não haver cortes salariais esquecendo, convenientemente, que também não há garantia de emprego. Nem falo de histórias mais ou menos rocambolescas como o corte de remunerações no Banco de Portugal poder ser considerado criação de moeda, algo interdito a qualquer país membro do Euro. É óbvio que, se o ridículo pagasse imposto, tínhamos o problema do défice resolvido. Esses casos são apenas a ponta do icebergue: em geral, todos os grupos de interesse da Função Pública mesmo quando consideram a contenção da despesa necessária acham-na impensável no seu sector.
Como o ministro das Finanças afirmou, a salvaguarda do objectivo estabelecido para o défice requer mais 500 milhões de euros. Os contribuintes portugueses atingiram um estado de saturação e estão cada vez menos disponíveis para continuar a pagar o que lhes parecem mordomias, por mais que as corporações da função pública os considerem direitos. Para além de uma ou outra receita pontual (relembro as chicletes!), o grosso daquela verba tem, por isso, que provir de uma multiplicidade de pequenos cortes em despesas de funcionamento. Sem a colaboração dos funcionários públicos esse propósito será muito difícil de atingir. Como já aqui escrevi, os melhores de entre eles deveriam ser os mais empenhados em concretizar as reformas, como forma de reduzir a despesa e, pelo mesmo caminho, poderem aspirar a aumentar as suas remunerações. Se assim não for, Teixeira dos Santos terá muito trabalho pela frente e os funcionários públicos, muito provavelmente, mais reduções nos vencimentos.
A radicalização abre as portas às soluções que pretensamente combate e condena o serviço público ao definhamento. A melhor alternativa no imediato pode não ser aquela que garante o futuro.