Londres - A caminho do Médio Oriente, paro em Londres para falar com legiões de exilados árabes, ansiosos por reconstruir e regressar (mas o Egipto, por exemplo, não deixa votar os seus emigrados). Paro para falar de outra crise, com observadores ingleses. Desta vez, infelizmente, Portugal. É mais grave, ou menos, do que a das chamas da Líbia? A doutrina divide-se. Entre nós, não morre ninguém, mas empenham-se gerações.
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O chanceler do Tesouro inglês, George Osborne, acaba de colocar o problema "lusitano" de forma muito clara: embora o Reino Unido tenha um défice muito mais colossal do que o nosso, conseguiu manter os juros a taxas baixas, como a Alemanha, porque possui "credibilidade". Como é que esta se manifesta? Pela divulgação pública de medidas de austeridade, controlo e pagamento, consideradas aceitáveis pelos mercados internacionais.
Por outras palavras: não se trata de saber, no caso da dívida soberana, se devemos muito ou pouco. Isto é importante, mas não é o mais importante. O que interessa, em primeira linha, é conhecer se temos planos credíveis para pagar. E, desgraçadamente, depois de tantas estratégias, pareceres, estudos, explosões cerebrais de centenas de especialistas e assessores, a verdade é que não temos.
Uma das consequências perversas da queda (provisória?) de Sócrates é, precisamente, a de ela poder revelar o desacordo nacional quanto às medidas de fortalecimento da nossa credibilidade de devedor externo. A de ela significar confusão, indecisão, incapacidade e desnorte, para quem olha de fora, sem compreender a filigrana e o gongorismo dos discursos no Parlamento.
A demissão do Governo poderia ser, noutras circunstâncias, uma virtude. Aqui surge como uma derrota do caminho nacional para sair da crise. Sai Sócrates, e ficamos mais perto de Atenas.
Há dois problemas suplementares, que não são também compreendidos pelos mercados. O Governo vende a tese de que fez tudo bem, mas que não chega. E que por isso, com a corda na garganta, precisou de anunciar, de forma atabalhoada, soluções reforçadas em Bruxelas. A Oposição diz que, se a execução tivesse sido competente, não seriam precisas novas medidas. Mas de fora, os "mercados", e os conselheiros de Cameron, só vêem a incapacidade portuguesa de apresentar uma solução comum, uma frente solidária, uma ideia unificadora.
Por outro lado, há forças na Oposição que afirmam ter mais e melhores ideias sobre a forma de sair do túnel. Mas de fora, outra vez, a Oposição parece opor-se a uma forma razoável de nos tornar aceitáveis.
Ou seja: qualquer próximo governo tem, antes de tudo, de explicar ao que vem. Não só dentro de casa, mas sobretudo fora. E que os sacrifícios podem ter de ser gerados domesticamente, mas a mão amiga - com juros - vem do exterior.
Para quem, em Portugal, trabalha honestamente, não vive a crédito e passa mais de metade do dia desligado da família, sem subsídios de férias nem prebendas, tudo isto é demasiado. E sugere que precisamos, mais do que uma simples mudança, de uma complexa revolução.
A sério.