É bem verdade que "a democracia é o pior sistema político, depois de todos os outros". A famosa frase, proferida por Winston Churchill enquanto primeiro-ministro britânico, continua a ser sufragada, quase todos os dias, pelos factos e em todas as latitudes. Em Matosinhos, por exemplo, a sentença de Churchill aplica-se, por estes dias, na perfeição.
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Também é verdade que, mesmo cheia de entorses, a democracia permite, em princípio, a livre escolha dos líderes pelo povo (ou pelos militantes, no caso dos partidos). O problema surge quando à defeituosa democracia se tenta acrescentar, com o argumento da pluralidade, mais democracia. Costuma dar problemas. Em Matosinhos, está a dar uma bronca de consequências políticas ainda imprevisíveis.
António Parada, próximo de António José Seguro, deu uma abada a Guilherme Pinto, presidente da Câmara e próximo de José Sócrates, nas eleições para a Concelhia matosinhense do PS. Vai daí encheu o peito de ar e, numa entrevista concedida ao JN (ver edição da passada segunda-feira), disse o que se previa: ele é que é o candidato à liderança da Autarquia nas próximas eleições.
Problema: o PS inventou uma coisa chamada eleições diretas, para os casos em que há mais do que um candidato ao posto de presidente de Câmara. O leitor fará, por favor, um esforço para perceber as regras: se existir um candidato alternativo, ele tem de ter ao seu lado, cumulativamente, 10% dos militantes da Concelhia, 10% dos presidentes de junta e um terço da Comissão Política Concelhia.
É verdade que os estatutos do PS têm pontos de fuga que procuram travar confusões (exemplo: Guilherme Pinto, por ser o atual presidente de Câmara, não tem de cumprir aqueles critérios para se defender nas primárias). Mas o leitor já percebeu que, nos casos bicudos, esta coisa das primárias vai tirar horas de sono ao fleumático secretário-geral do PS.
Suponhamos que, apesar dos resultados de Parada, Seguro não quer ter em Matosinhos um candidato que, como Parada, defende "a autonomia da Petrogal de Leça da Palmeira" (sic). Eu perceberia Seguro, porque, na verdade, quem pede a "autonomia" de uma empresa privada (grupo Galp) pode pedir, a seguir e em doses cavalares, muitos outros absurdos de semelhante calibre. Mas quem votou em Parada perceberia que o líder do PS chumbasse quem o "povo" escolheu?
Além do problema dos (possíveis) sindicatos de voto e da opção por quem mostre mais notas de 500 em detrimento de quem mostre melhores ideias, as diretas (o PSD fugiu delas em bom tempo!) têm este engulho: aberto um precedente, António José Seguro arrisca perder o controlo do partido. O efeito Parada mostra à saciedade que a democracia está longe da perfeição...