A moção de censura do Bloco de Esquerda está condenada ao insucesso, o que cumpre as expectativas de Louçã que logo a anunciou dizendo que também tinha o PSD como destinatário, não fosse acontecer o improvável e Passos Coelho cair na tentação de a votar favoravelmente. Ou seja, Louçã lançou-a nestes termos precisos para impedir que tivesse sucesso, e para travar uma iniciativa idêntica de qualquer outro partido.
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Ora, uma vez que o líder do BE criticara, poucos dias antes, a direcção do PCP por Jerónimo de Sousa ter admitido apresentar uma moção de censura, não faltou quem o acusasse de mudar de opinião de forma leviana. E, não tendo sido os órgãos do seu partido ouvidos sobre a matéria, já se conhecem demissões no seu seio. A posição de Louçã também tem sido criticada na Imprensa por alguns dos seus tradicionais apoiantes. O primeiro a criticar o líder foi Daniel Oliveira, num debate da SIC e, posteriormente, na sua crónica no "Expresso", intitulada "Cinco razões para um disparate", em que admite que "o Bloco queria eleições antecipadas, queria que o PSD clarificasse a sua posição em relação ao Governo, queria antecipar-se ao PCP, queria pedir desculpas por ter apoiado Manuel Alegre ou apenas queria aparecer na televisão durante um mês". Depois, Rui Tavares manifestou a sua estupefacção pelo sucedido na sua crónica no "Público", em que admite que "o BE se quis livrar do vírus da colaboração com o PS, no rescaldo das presidenciais", concluindo que isso "seria uma dupla crise de confiança: do bloco em si mesmo como oposição; e do eleitorado no bloco como partido compreensível".
No entanto, o que Louçã pretende é mais simples, e menos tortuoso do que aquilo em que os seus amigos nos querem fazer crer. O líder do BE sabe que errou na estratégia das presidenciais, e tem a consciência de que a antecipação das eleições legislativas teria um impacto funesto na representação parlamentar do partido e, por consequência, na sua liderança até hoje indisputada. Recorreu, por isso, a um expediente táctico e dilatório. E, enquanto os seus adeptos discutem se a moção faz ou não faz sentido no plano táctico, ninguém lhe faz a única pergunta que me parece óbvia, e que aqui deixo à atenção do leitor. É que, admitindo que Louçã acreditava que havia a possibilidade de Manuel Alegre ganhar as eleições presidenciais, teria ele previsto, caso essa circunstância se verificasse, apresentar esta moção de censura contra o Governo do PS? Ou será que, pelo contrário, teria admitido (?) negociar com Sócrates, e com o patrocínio e beneplácito de Alegre, a entrada do Bloco para o Governo?
Com o seu tacticismo, Louçã conseguiu adiar as eleições legislativas. E, para tentar controlar as estruturas do seu partido, vai tomando medidas punitivas contra os militantes que não apoiaram a candidatura de Alegre contribuindo para a PRDização do Bloco. E, para devolver uma crítica que me foi feita por um blog que lhe é afecto, e que não terá apreciado os meus comentários televisivos a respeito dessa aproximação ou semelhança, está a demonstrar que o seu "partido-movimento de crescimento sustentado de eleição para eleição nos últimos 10 anos" não passa de um "projecto de poder unipessoal, e sem ideologia definida".
Louça diz que Portugal é mais desigual que o Egipto. Ora, a similitude mais flagrante entre Portugal e o Egipto parece-me ser, neste momento, a agitação no seio do Bloco de Esquerda...