Nos últimos anos, numa reação aceitável em relação a uma política desregrada em que todo o investimento público se justificava sem grande sustentação, Portugal diabolizou a utilização do dinheiro de todos nós para o bem comum.
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Em ano de eleições, era bom que conseguíssemos pelo menos chegar ao 44 sobre este assunto, aquele número de ponderação que fica entre o 8 e o 80.
Não é de mais recordar, nem é de mais repetir, que não foi há muito tempo que Lisboa precisava urgentemente de um segundo aeroporto para resolver o problema de uma Portela sobrelotada que, segundo revelou já este ano a ANA, afinal ainda está a 60% da sua capacidade. Nem é preciso passear pelas autoestradas vazias por esse país fora, para entender que se anteciparam necessidades de país rico num país que não vai além do remediado.
Isso não nos pode fazer esquecer o papel essencial que representa o investimento público como motor de uma sociedade. Se o devemos domar, não o podemos remeter para o lugar das maldições, substituindo-o por um mantra em que tudo é privatizável, desde a Caixa Geral de Depósitos até às Comissões de Proteção de Jovens e Crianças.
Com três letrinhas apenas se escreve como a cupidez e a irresponsabilidade não está só do lado do público e tem efeitos no bolso de todos nós. BES ou BCP, é escolher. E arrumada a questão moral e o preconceito ideológico, tentemos ver as coisas com algum realismo, que é o que se pede a um país que precisa de saber enunciar desenvolvimento de uma forma capaz e sustentada.
Olhemos para o que escreveu a economista Mariana Mazzucato, no seu livro "O Estado empreendedor", em que explica que mesmo geniais empreendedores, como Steve Jobs, precisaram de bolsas de investigação e de programas estatais para germinarem ou que grandes inovações como a Internet, o GPS ou o ecrã tátil nascerem em organismos governamentais. A italiana, recentemente em Lisboa a convite do PS, destacou que países como a Alemanha ou os Estados Unidos continuam a fazer enormes investimentos públicos em inovação e só isso é que lhes permite manterem-se na vanguarda.
Lembremo-nos por isto tudo de Mariano Gago e de toda a sua obra, justamente elogiada mas também ameaçada. De como ele ajudou a desenvolver a Ciência num país saído do analfabetismo, num trabalho sustentado em instituições públicas e em investimento público de que ainda hoje o setor privado, e todos nós, beneficiamos. A sua memória é um bom mote para o elogio do que é público.
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