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1 Nunca os portugueses pagaram tantos impostos. Por via do imposto sobre o consumo (IVA), que chega a todos; e através do IRS, que atinge com particular eficácia os rendimentos do trabalho. No caso deste último, a canga tornou--se quase insuportável com a conjugação de um agravamento direto do imposto e a criação da sobretaxa. E assim chegámos a 2015, mais pobres, mas a pagar mais impostos. Acontece que este era também um ano eleitoral e portanto tempo de iludir os eleitores. A solução que o Governo tirou da cartola foi essa originalidade do "crédito fiscal". Ou seja, se a recolha de impostos crescesse acima do previsto, devolveria a diferença aos contribuintes. Para garantir credibilidade à fantasia, PSD e CDS encarregaram a máquina fiscal, supostamente isenta, de nos informar da evolução do reembolso. A trajetória foi sempre ascendente e, no mês anterior ao das eleições, já se prometia uma devolução de 35% da sobretaxa do IRS. A euforia durou pouco. Mês e meio depois das eleições e no último dia em funções de Passos e Portas, fica a certeza de que será devolvida coisa nenhuma. O Governo acaba como começou, com uma espécie de fraude eleitoral, prometendo uma coisa, para fazer o seu contrário. Não vale a pena perder tempo com a triste figura de Paulo Núncio no Parlamento. Limitou-se a cumprir o papel de cordeiro sacrificial. O epitáfio deste Governo deve ser atribuído a quem fez da mentira uma arma de arremesso eleitoral: o ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho.
2 É um dos axiomas do capitalismo: o dinheiro não tem pátria. Nem na nossa versão de trazer por casa, como ficou provado por estes dias, com a multiplicação de notícias, primeiro sobre a distribuição apressada e antecipada de dividendos entre algumas grandes empresas portuguesas, um truque para escapar a um eventual agravamento fiscal em sede de IRC (e em cuja vanguarda está, como sempre, o Grupo Jerónimo Martins); depois, com a confirmação de que boa parte desse e de outro dinheiro já foi recambiado para paragens mais seguras. O alerta, em forma de chantagem, sobre a fuga de capitais, fê-lo António Saraiva, o patrão dos patrões: não só há empresários a "tirar o dinheiro do país", como ele só regressará em função "das medidas que o próximo Governo vier a tomar". Sendo certo que há "linhas vermelhas" que não serão toleradas. Ora, ao contrário do que gostam de dizer os nossos capitalistas, este tipo de atitudes e de linguagem não remete para a economia de mercado. Pode ser legal, mas chama-se pilhagem.
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