<p>O país está no charco. Mas mais ainda está no fundo desse charco o discurso sobre os dias do país. Estamos numa enorme encruzilhada. Numa opinião de quase totalidade unânime, como há muito não se ouvia no país, pelas mais diversas personalidades colocadas na liderança dos vários campos de actividade, se tem dito e redito: ou o Orçamento do Estado passa na Assembleia da República ou o país entra na bancarrota. Para além da bondade ou não deste documento, a mensagem discursiva que ecoa nos ouvidos tem sido apenas esta: a da indispensabilidade de fazer passar o OE. Mas este insistente e dramático apelo assume o absurdo se o trocarmos em termos absolutos na verdade que ele quer dizer: é indispensável que o PSD não vote contra, mas se abstenha.</p>
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Com este panorama no horizonte, tem-se assistido a um "jogo político" que, num plano de consciência cívica, atinge o grau zero da política.
O grande temor disfarçadamente escondido e envergonhado na "romagem" dos banqueiros a "casa" dos políticos é aquele de verem cortados todos os créditos, cujas consequências para eles e para o país não são ainda, neste momento, totalmente previsíveis.
E no apelo unânime daqueles que conduziram durante anos os nossos destinos transparece o rebate de consciência de nunca terem conseguido inverter, estruturalmente, a ordem das coisas financeiras, económicas e sociais que nos leva agora à desesperante hipótese de bater no fundo.
Li no decorrer desta semana, na Imprensa portuguesa, bastante marcada por colunas de opinião, mais de 70 artigos. O tema central ou transversal de quase todos os autores fazedores de opinião era o da inevitabilidade de fazer passar o Orçamento. Aliás, a opinião expressa pelos comentadores da rádio ou da televisão insistia na mesma tecla. Evidentemente muitos desses artigos ou comentários analisavam as causas e as responsabilidades da situação presente. Mas o argumento da "inevitabilidade" era o mais forte.
E neste caso, num apelo à cidadania política dos portugueses, apetece-me levantar uma questão. Não será esta a crise mais profunda a que chegámos: forçar a "inevitabilidade" da aprovação, por abstenção, de um partido, ainda que o maior da Oposição e, portanto, alternativo na escala do Poder?
Politicamente também estamos no charco.