Algum mau-olhado foi lançado sobre os socialistas de Matosinhos. A explicação para as sucessivas divergências, para usar um eufemismo, que transformaram o concelho numa espécie de montra onde estão expostos mil e um exemplos de como não fazer política já não está no domínio do racional. Está para lá do que o conhecimento pode alcançar.
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É assim desde que Narciso Miranda entregou a Câmara a Manuel Seabra, quando, embalado pelo canto cantado pela sereia do Poder, o "senhor de Matosinhos" foi para o Governo de Guterres. Ao regressar, Narciso quis voltar à Autarquia. Que Seabra não queria largar. Daí ao trágico episódio do mercado de Leixões, na sequência do qual faleceu Sousa Franco, foi um tirinho.
O partido partiu-se (coisa habitual no Porto) e a escolha foi salomónica: nem Narciso, nem Seabra. Guilherme Pinto foi o candidato à Autarquia. Venceu. Narciso nunca engoliu o sapo: candidatou-se, outra vez com o partido ao rubro, contra Guilherme. Perdeu.
Este vigoroso passado tem agora um vigoroso presente. Guilherme quer continuar a obra, mas, azar dos azares, o partido inventou uma coisa chamada diretas: se houver mais do que um candidato à Autarquia, o problema é resolvido pelos militantes. Ora, os militantes de Matosinhos estão com o presidente da Concelhia. E António Parada quer ser candidato.
E agora? Agora a coisa chegou a este ponto: Guilherme Pinto não vai a primárias (porque sabe que perde) e atirou o explosivo embrulho para os braços do presidente da Distrital, José Luís Carneiro, e de António José Seguro. Argumento: a Distrital tem uma sondagem "que dá que a única candidatura que o PS tem suscetível de conquistar o apreço dos cidadãos [de Matosinhos] é a do atual presidente da Câmara". Responde Carneiro: "Isso é completamente falso. Eu não transmiti resultados de nenhuma sondagem ao dr. Guilherme Pinto".
Quer dizer: o caldo está definitivamente entornado. O leitor, sobretudo o de Matosinhos, tem o direito de perguntar: quem está a mentir, Guilherme ou Carneiro? Se for Guilherme, a coisa é grave, na exata medida em que, como diz o velho ditado, quem mente uma vez, mente duas ou três. Ora, um autarca que mente não é personagem que se recomende. Se a mentira for de Carneiro, é igualmente grave, porque, aplicando-se o mesmo vetusto provérbio, também não se recomenda que personagem com cargo tão relevante como o de presidente de uma relevante Distrital possa torcer a verdade até que ela espirre a parte mais conveniente.
A embrulhada é já tão grande que, é evidente, haverá feridos, mais ou menos graves, nesta contenda. Por que se autoflagela desta forma tão determinada o PS? O coração dos socialistas tem razões que a própria razão desconhece. Só pode ser.