<p>Há duas semanas a possibilidade de uma séria crise se abater sobre a Autoeuropa, por falta de acordo entre trabalhadores e empresa, fez correr muita tinta. A garantia dada nessa altura pela administração de que não estava em causa a transferência da produção para outro país não chegou para sossegar ninguém. É que, falhadas as negociações, a empresa só tinha uma saída: despedir e reduzir turnos. Quem perderia com isso? Os trabalhadores.</p>
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Volvido este tempo, sabe-se agora que a Comissão de Trabalhadores (CT) da Autoeuropa alcançou, ontem, um pré-acordo com a administração da empresa que garante a manutenção de 250 empregos temporários (a totalidade dos que estavam mais ameaçados), sendo que alguns deles poderão mesmo passar a efectivos. Trata-se de uma das mais importantes notícias das últimas semanas. Porquê? Por várias e substantivas razões que vale a pena recordar.
Desde logo, pela tremenda importância que a Autoeuropa tem para a economia nacional. O seu contributo para o Produto Interno Bruto (indicador que mede riqueza produzida pelo país) é de 1%. Directamente, a empresa dá trabalho a cerca de três mil pessoas. Indirectamente, emprega mais 10 mil (13 mil pessoas e respectivas famílias dependem, portanto, da Autoeuropa). A empresa do grupo Volkswagen é a segunda maior exportadora do nosso país, logo a seguir à Galp Energia. E, não menos importante do que tudo isto, a Autoeuropa pesa apenas 2% nas contas da casa-mãe, o que significa que os patrões não terão grande pejo em mudar de ares, caso a corda estique de mais.
Depois, este acordo, que também afasta a eventual aplicação de um "lay-off", permite transformar a Autoeuropa numa das mais flexíveis fábricas do grupo alemão, em termos de mão-de-obra, o que abre interessantes perspectivas para a produção em Portugal de novos modelos de automóveis no futuro.
O exemplo dado pelos trabalhadores da Autoeuropa é, por isso, de enorme relevância. Em vez de ficarem acantonados, como muitos gostariam por motivos meramente políticos, na intransigente defesa dos famosos "direitos adquiridos", afrontando a administração, souberam, mais uma vez, manter sempre aberta a porta das negociações. E com isso salvaram 250 postos de trabalho e reconquistaram a paz social na empresa.
Esta obra tem dono: chama-se António Chora, presidente da CT da Autoeuropa, um hábil e consciente negociador. A economia nacional só teria a ganhar se nas empresas com igual ou menor importância que a Europa este exemplo de sucesso fosse replicado, com as necessárias adaptações à realidade de cada uma delas. O tempo reclama negociação e flexibilidade, em vez de uma intransigente contestação e de uma prejudicial passividade.