A quantidade de pequenos e grandes casos que abalaram o Governo desde que se viu maioritário, há mais de um ano, seria suficiente para criar uma alternativa fortíssima no maior partido da Oposição, ainda que merecedora de pouca atenção e de tão forte crescimento. Quase num movimento involuntário, o alargamento era mais do que inevitável. Nem mesmo o PPD poderia fazer o que quer que fosse para impedir o PSD de ser Governo.
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Só circunstâncias anómalas poderiam impedir o crescimento dos sociais-democratas como alternativa séria, evidente e sustentada nas sondagens, após meses de sangria pessoal entre ministros, secretários de Estado e acólitos. Os números das sondagens já deviam ser indesmentíveis. Finalmente, após meses e meses de tacticismo de pacote, a demarcação do PSD da extrema-direita aparece como uma imposição e não pela percepção da bondade e inevitabilidade da ruptura. Foi Marcelo que a isso obrigou, e bem.
Luís Montenegro foi forçado a clarificar sob pena de não ser levado a sério pelo presidente da República: "Quero garantir uma coisa aos portugueses: não vamos ter no Governo nem políticas nem políticos racistas, nem xenófobos, nem oportunistas, nem populistas - ou apoio político", assegurou o líder do PSD. Farto de esperar por uma alternativa que não aparece, Marcelo resolveu convocar Montenegro para o fim da irresponsabilidade. A demarcação da extrema-direita é o único caminho para o crescimento laranja. O PSD nunca cresceu ou poderá crescer colado ao Chega, só conseguirá enfraquecer-se. Até poderia conseguir formar Governo, em regime de dependência. Mas crescer, nunca. Daí à subalternidade, vai um pequeno passo.
Ao mesmo tempo que se demarca da extrema-direita, fazendo aquilo que tem de fazer como partido fundador da democracia, o PSD promove o duplo esvaziamento: convoca a parte mais centrista do PS à alternativa do voto (dissipando o medo de que o PSD se possa aliar ao CH) e permite o crescimento dos partidos à esquerda do PS, contendo o voto útil que entregou a maioria absoluta ao socialistas pelo mesmo e exacto motivo.
Agora, talvez tarde e a más horas, e por decreto presidencial, o PSD espera, aparentemente sozinho e capaz, por mais passos em falso do Governo. Não faltam condimentos, apesar do esforço de António Costa em responder à ebulição. Em permanente tempestade, a TAP será um filão inesgotável que não se pode normalizar como novela.
o autor escreve segundo a antiga ortografia
*Músico e jurista