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Se havia quem ainda acreditava que este Governo tivesse algum tempo de vida, após a aprovação deste Orçamento, ficou esta semana desenganado, passando a engrossar a enorme corrente dos que entendem o contrário. E isto porque um conjunto de factos acontecidos recentemente o vem denunciar.
Em primeiro lugar, o comunicado do CDS.
Se a ideia era serenar aqueles que acreditam que uma crise política agravaria as condições do país para sair da profunda crise económica, financeira e social em que se encontra, o efeito foi precisamente o contrário. O que este comunicado vem provar é aquilo que já todos sabemos - que a instabilidade no seio da coligação é indisfarçável e que já não há remodelação capaz de a dissimular. Numa coligação de governo, votar os orçamentos é condição básica da sua própria existência. Não precisa nem deve ser proclamado que vai votar-se favoravelmente, porque o voto contra significaria a rutura desta coligação e a consequente queda do Governo. Se se veio a público afirmar o que não precisava de ser dito é porque o cenário do voto contra esteve em cima da mesa. E sabemos que esteve.
Depois, a mensagem do presidente da República no facebook.
Com tantas formas de comunicar com o Governo, incluindo os
contactos pessoais que formalmente mantém com o primeiro-ministro em cada semana, Cavaco Silva optou pelas redes sociais.
Porquê? Porque quis tornar público o seu pensamento sem usar a bomba atómica da comunicação ao país ou ao Parlamento. Quis que os portugueses soubessem que também ele não está de acordo com o rumo que este Orçamento traçou para o país. Mesmo admitindo que o presidente da República fez uma avaliação menos correta das declarações da chefe do FMI sobre a redução do défice, o que a sua posição demonstra é uma clara discordância com a política económica do Governo.
Finalmente, o incontável número de previsões efetuadas recentemente por instituições credíveis que agravam fortemente o cenário de recessão traçado pelo governo e que põem em causa o brutal conjunto de sacrifícios a que estão sujeitos os portugueses.
É evidente que a política económica deste Governo é a traçada pelo ministro Vítor Gaspar. Ele é o rosto das medidas impopulares, a face que nos aparece a dar as piores notícias, sendo que é sua a estratégia para superar a crise. Daqui decorre inevitavelmente a pergunta com que nos interrogamos. É ele competente para dar conta das responsabilidades que assumiu ou não?
Se é competente, sabe que este caminho não vai levar-nos a superar a crise que nos atormenta. E se sabe e persiste nesta política, então está a sujeitar o país a sacrifícios inúteis, pelo que não deve continuar no Governo.
Se é incompetente e acredita candidamente que este modelo que arquitetou vai tirar-nos do fosso em que nos encontramos, apesar da mais acreditada opinião especializada dizer o contrário, então os sacrifícios continuam inúteis, pelo que também não pode continuar no Governo.
A grande questão é que o primeiro-ministro assumiu sempre como suas e do seu Governo todas estas medidas, sendo que é o ministro das Finanças o interlocutor junto das instituições internacionais com quem negociamos e quem, em nome do Estado português, apresenta as propostas e as discute. Torna-se, por tudo isto, irremodelável. O seu afastamento não se fará sem grandes danos para o Governo e viria a arrastar o próprio primeiro-ministro.
Em abono deste entendimento, basta lembrar o que tem acontecido em tempos de grandes dificuldades, apesar do ministro das Finanças e do primeiro-ministro terem uma outra credibilidade.
Foi assim com Ernâni Lopes, apesar da enorme autoridade de Mário Soares; e mais recentemente, em fim de ciclo, viu-se o mesmo com Teixeira dos Santos, apesar da insuperável determinação de José Sócrates.
O fracasso da política económica e financeira assumida por este Governo não será nunca o fracasso solitário de Vítor Gaspar. Ele será sobretudo o de Pedro Passos Coelho, garante de uma política em já quase ninguém acredita.