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O JN titulou na primeira página, a propósito do debate entre Pedro Passos Coelho e António Costa, que tinha havido "muito passado" e "pouco futuro". É verdade e não é necessariamente tão mau como soa.
O momento eleitoral é feito de projeção, de propostas dos candidatos - não tanto de "promessas", que entraram em desuso por desgaste - mas também de avaliação do ciclo percorrido. O estranho era ser de outra forma e o estranho era aquilo que vivíamos, com uma coligação a "fazer de morto", tentando escapar à análise dos últimos quatro anos, e uma oposição tolhida por aquilo que se tinha passado há quatro anos.
Por isso, este era o "debate dos debates". Porque pela primeira vez obrigava Passos a vir à liça com o PS, dois líderes depois da entrada da troika e porque se tratava, em termos televisivos, de uma oportunidade única. O passado seria tema obrigatório em qualquer debate inicial e o facto estranho é outros debates não se seguirem em que, naturalmente, o passado seria deixado para trás.
Não foi a isso que conduziu a estratégia de "fazer de morto" e como tal a margem de erro era mínima, potenciada pelo facto das três televisões transmitirem o debate. O passado dominou a discussão política e pode-se resumir dizendo que Costa foi mais eficaz a colar Passos à troika e à austeridade do que este a colar o líder do PS a Sócrates e à sua herança.
Arrepiando caminho em relação ao passado, Costa acabaria por conseguir garantir futuro para algumas ideias-chave para a candidatura do PS que vinham faltando, como a de que o Governo pretendeu "ir além da troika" e de que assim prosseguirá. Passos bem repetiu o nome de José Sócrates, mas a estratégia, de tão evidente, foi perdendo efeito e esteve muito menos incisivo do que o seu adversário, retirando-lhe capacidade para criticar as propostas do programa do PS.
Com a vitória no debate, António Costa deu um novo fôlego às hostes socialistas, desanimadas pela quebra nas sondagens e conseguiu, pelo menos para já, fugir da sombra de José Sócrates. Passos Coelho vai ter de repensar se a estratégia de não se mover para não errar é suficiente para almejar uma vitória e avaliar os danos de um mau momento. Os portugueses, e não foram poucos, puderam assistir a um momento de política puro e se ainda não conseguem ver muito bem o futuro, pelo menos puderam arrumar melhor o seu passado. A campanha eleitoral começou.