Um dia depois de a Polícia Judiciária ter levado um valente abanão na sua imagem e credibilidade por causa do arquivamento do caso Maddie, seria de esperar que os seus responsáveis máximos mergulhassem numa profunda reflexão para tentar perceber o que correu mal no processo e, sobretudo, para encontrar as causas do falhanço e aprender com elas.
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Nada disso. Um dia depois do arquivamento, regressa o habitual espectáculo: a pressa em sacudir a água do capote, antes que alguém tenha a veleidade de pedir responsabilidades pelo fracasso.
Alípio Ribeiro, o ex-director que saiu da PJ depois de dar a machada final no caso, ao classificar de "precipitada" a constituição como arguidos dos pais da menina inglesa, não esperou um segundo para mostrar a ânsia em ajustar contas com o passado. Num artigo de opinião publicado no Diário Económico, afirmou que "um arquivamento precipitado pode vir a prejudicar, quem sabe se definitivamente, um esclarecimento posterior". Resposta de Almeida Rodrigues, o homem que Alípio indicou para seu sucessor na PJ: "O Dr. Alípio não ficou propriamente conhecido pelos seus dotes de investigador". Não é bonito, quando colegas de profissão se tratam em público desta forma tão cordial?
Este é, certamente, o primeiro de vários episódios em que os protagonistas da investigação hão-de envolver-se com o jeitinho do costume. Se um partir um prato, o outro quererá escaqueirar um serviço inteiro. O segundo episódio está marcado já para amanhã, com a saída do livro de Gonçalo Amaral, que nos dará a "sua" versão dos factos. Logo se verá o que se segue, nesta estratégia absolutamente precipitada e desnecessária que apenas fere ainda mais o bom nome de uma instituição que com inteira justiça ganhou prestígio cá dentro e lá fora.
O mais preocupante em todo este caso - e era nisso que devíamos centrar a discusão - é que ele mostra à saciedade como a PJ está hoje pouco preparada para responder a situações desta gravidade e exigência. O problema está nos métodos usados para a obtenção de indícios e confissões? Nos meios que a PJ tem, ou não tem, ao seu dispor? Nas condições de trabalho? No relacionamento com o Ministério Público?
Seja o que for, a verdade é que, se ao caso Maddie somarmos outros "dossiês" igualmente escaldantes que ou resultaram em nada ou ameaçam resultar em muito pouco (Operação Furacão, Casa Pia, Apito Dourado, por exemplo), a conclusão assusta: há um fosso desmesurado entre as expectativas criadas no início das investigações e os resultados obtidos. O que, como está bom de ver, ajuda muito pouco à solidificação da imagem da PJ. E da Justiça.