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1. Num dos recentes programas da SIC que se propunha desvendar o lado menos conhecido dos líderes políticos, Paulo Portas, instado a contar uma anedota que lhe agradasse especialmente, foi buscar uma passagem do seu "boneco" no "Contra-informação", de dentadura tão luzidia que, conduzindo de noite, encandeava os outros automobilistas. A "anedota" pode não ter grande pilhéria. Mas a sua escolha revela o que o presidente do CDS quis transmitir: que é capaz de se rir de si próprio. Ontem, no "Esmiuça a campanha", Portas não chegou a fazer esse exercício. Tentou jogar na ofensiva, para comandar o diálogo, mas não resistiu à colagem do discurso de campanha, que soou deslocado.
No teste do riso, perante o impiedoso Ricardo Araújo Pereira, metade do país esperava secretamente que Manuela Ferreira Leite se espalhasse ao comprido. Ninguém dava um chavo pelo humor da senhora, mas ela surpreendeu toda a gente. Não pela autenticidade, que é a sua imagem de marca, mas pela inesperada resposta na ponta da língua, desconcertante até para o "gato" que a interrogava, depois de prudentes pausas.
Parece fácil, leve e fresco, mas não é. Nem se consegue com preparação prévia, por mais apurada que seja. Ou se tem ou não se tem humor. A líder do PSD mostrou que o tem, embora prefira, no quotidiano político, carregar uma imagem austera, acreditando que casa bem com sentido de responsabilidade. Ferreira Leite pode ter marcado pontos. Até porque o formato da entrevista no "Esmiuça o sufrágio" tende a capturar fragilidades, pôr a nu a falta de capacidade de encaixe, quebrar o autocontrolo do entrevistado. Ou seja: fazer com que lhe "salte a tampa".
Com um Sócrates mais "formatado", uma Ferreira Leite mais genuína e um Portas mais interventivo, o programa dos "Gatos" seduziu muito mais espectadores do que os debates a dois que antecederam a campanha oficial. Já fez mais pela humanização da política do que todos os comícios juntos.
2. Domingos Lopes saiu do PCP. Ficámos a saber que ele ainda por lá andava, apesar de tantas vezes parecer prestes a zarpar. Descobriu subitamente que o centralismo democrático - "tal como a Direcção do partido o entende", notou - não é senão um instrumento de controlo da linha política. E só agora se descobriu solidário com Carlos Brito e Edgar Correia, que o partido empurrou para o limbo há quase dez anos.
O argumento mais "forte" para a demissão é, porém, de ordem "histórico-ideológica", digamos assim: que o PCP ainda não condenou a invasão da Checoslováquia, ocorrida em 1968! De quem passou 40 anos no partido, com altas responsabilidades, o melhor contributo para o humor político.