Estava na fila para entrar no Alhambra, em Granada. Um dos mais importantes testemunhos da presença da civilização islâmica na Península Ibérica. Era agosto, estava um calor infernal na que chegou a ser a capital do Al-Andaluz. À minha frente na fila estava uma família de quatro. O pai e o filho vestiam t-shirt, calção, sandálias e boné. Nada os distinguia, nem da minha família, nem dos outros milhares de pessoas que iam e vinham. Nada, a não ser o facto da mãe e da filha estarem tapadas desde o tornozelo aos pulsos e ainda com uma espécie de gabardine por cima de uma primeira camada de roupa, anulando a possibilidade de reconhecer qualquer traço feminino. Repito, estava um calor infernal.
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A espera foi longa e a cena irritou-me ainda mais do que o sol que me queimava os neurónios. Soltei alguns desabafos, aproveitando o facto do califa não perceber nada do que eu dizia. Irritou-me porque estava ali, à minha frente, um dos piores exemplos do radicalismo intrínseco ao islamismo: a menorização e subalternização da mulher, um ser inferior que tem de ser tutelado pelo macho.
Ontem, em França, as ruas e praças encheram-se com milhões de pessoas. Gente que prestou um tributo às 17 vítimas inocentes de três assassinos. Gente que decidiu marcar uma posição que fortalece os pilares do Mundo em que vivemos ou em que queremos viver: a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Mas foi também uma manifestação em que fica claro que há uma linha que separa a civilização do mundo obscurantista do fundamentalismo religioso.
Nada autoriza a que se considere cada muçulmano como um fanático. Muito menos que confundamos cada um deles com um terrorista. Mas não se pode ignorar que o Islão é ao mesmo tempo uma fé religiosa e uma comunidade social e política. E que muitos milhões de muçulmanos, não sei se a maioria, mas seguramente uma parte considerável, leva à letra, quer o Corão, quer a interpretação radical que lhe dão muitos dos seus clérigos. E não podemos ignorar, só porque não é politicamente correto, ou porque pode ser confundido com islamofobia, que esse radicalismo é um ambiente favorável ao desenvolvimento de uma cultura de violência. Como não devemos esquecer que a violência não se exerce necessariamente de Kalashnikov em punho.
Aquilo que testemunhei à entrada do Alhambra não é outra coisa senão uma forma de violência radical sobre as mulheres. Fazendo um paralelismo com uma frase muito usada nos jogos de futebol de rua ou de recreio de escola, e ela própria machista, o Islão não é para meninas.
* EDITOR EXECUTIVO