O Bloco de Esquerda entra no Parlamento em 1999 com a eleição de dois deputados: Francisco Louçã é um deles e torna-se, durante mais de uma década, o rosto da nova Esquerda portuguesa. Seis anos depois, o BE elege oito deputados.
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Cotrim Figueiredo chega a deputado em 2019 e também ele se torna o rosto político do liberalismo em Portugal. Sob a sua liderança, a IL elege oito deputados em 2022.
As semelhanças não são só de aritmética. Quando surgem, o BE de Louçã e a IL de Cotrim trazem uma proposta de novidade. O Bloco quis ser um socialismo mais sexy do que o PCP e mais empolgante do que o PS, trazendo uma agenda temática e mediática de causas concretas, como a legalização da interrupção voluntária da gravidez, ou do consumo de marijuana. Já a IL aparece para ser a novidade entre o monopólio do PSD e do CDS. A sua proposta também é muito concreta: é preciso libertar a economia e as pessoas do peso do Estado. A luta é contra a opressão fiscal, e a política serve para libertar o indivíduo. A taxa única do IRS dá corpo ao que a Iniciativa Liberal trouxe para a política nacional.
Curiosamente, esta estratégia captou exatamente o mesmo público alvo do Bloco: urbano, instruído e de classe média alta. E trouxe para as urnas um eleitorado mais jovem, transformando o que era abstenção em ativismo político.
Não é um acaso a geografia eleitoral onde são eleitos os deputados do BE e da IL.
Depois há outra semelhança: a saída de palco. Louçã sai em 2012 a empurrar o BE para uma liderança bicéfala (João Semedo e Catarina Martins), que apoia. Já Cotrim sai a fazer exatamente o mesmo com o candidato Rui Rocha.
E aqui começam as diferenças. Louçã sai com o mandato cumprido e cria a solução que apoia, mas apoia também a estratégia. Cotrim sai de repente, a menos de meio mandato. Explica que vê agora um ciclo político que não via há dez meses e que o partido terá uma estratégia de popularização que o próprio não consegue executar, mas o país fica sem saber se apoia a estratégia que rejeitou quando se apresentou aos portugueses em 2022.
Talvez tudo isto resulte do medo de ver a IL esmagada entre a força de protesto do Chega e o apelo da ida para o poder do PSD. Talvez não seja uma saída de facto, mas uma poupança de desgaste político para dar entrada na corrida às eleições europeias, ou até tentar Belém como candidato da IL, de novo fresco.
Louçã também foi candidato presidencial em 2006, com o apoio do BE, mas sabia-se o que era o BE.
Resta saber o que virá a ser a IL popular e o que de facto Cotrim apoia.
*Diretor-Geral Editorial