<p>Esta estranha campanha pela estabilidade do país corre o risco de ser descoberta pelo "sexto sentido" do povo. E provavelmente é disso que muitos dos propaladores de que é preciso um "governo de salvação nacional", um "governo de largo consenso", estão a temer. Dado que é cada vez mais nítido que, com as actuais lideranças, PS e PSD apenas estarão de acordo em garantir a frágil e aparente estabilidade para fazer passar, antes na generalidade, agora na especialidade, o Orçamento, o tal requisito, ao que parece meio falido, para fazer baixar os altos juros da dívida soberana, os homens do ainda efectivo poder deste Estado estão deveras preocupados. Porque pensam que a crise política (padrão de fundo da crise financeira e económica), mais tarde ou mais cedo, vai exigir eleições. E face ao que tudo tem acontecido no cenário eleitoral português, parece que aumenta a confraria daqueles que desconfiam do ser "estúpido" o voto do povo. Esses vêem em perda a tese de que o povo é sempre sábio a votar. </p>
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Ora, os defensores de uma solução que não passe pelas urnas movem-se na área do poder das forças que, efectivamente, têm mandado neste país. Agora, esta crise é de dinheiro, de negócios, de poder e, sobretudo, esbarra na contestação e provável revolta do povo que não tem ou vive do seu salário. E, para eles, ir a votos nesta circunstância é jogar na roleta.
Já perceberam que Sócrates, apesar de tudo e ao contrário deles, nunca esbanjará a hipótese de ir a eleições. "Perdido por cem, perdido por mil". Por seu lado, Passos Coelho, como é legítimo e inteligente, só quererá ir para o Governo com o lugar conquistado por eleições. E se depois da execução ou "espalhanço" deste Orçamento, tanto melhor.
Num cenário de eventuais eleições, por via de todos os males que esta crise nos trouxe, não será difícil admitir que o PSD possa vir a ser o partido mais votado e o PS o partido mais castigado, mas, por conta da matriz do seu eleitorado, nunca abaixo dos 25 % dos votos. Também não será difícil prognosticar que os partidos da Esquerda-esquerda, acusados de nada contribuírem para a solução da crise, mas, pelo povo, identificados como os seus defensores, somarão os votos suficientes para não dar maioria ao PSD, porventura mesmo coligado com o CDS. E ainda por cima, nesta hipótese, o PS sentir-se-ia mais à vontade para "puxar" à Esquerda.
A tensão mantém-se. Entre a bancarrota financeira e a da democracia.