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A fábrica de propaganda de Hollywood vendeu-nos o sonho americano. A ilusão de que a combinação de talento e esforço é garantia infalível de sucesso para todos e qualquer um. A meritocracia tornou-se um ideal a perseguir, uma ideologia conceptual e moralmente elevada, por oposição à aristocracia e ao nepotismo, mas que padece de um defeito de base: ignora que as condições com que cada um se lança à vida são distintas e geradoras de iniquidades. Um estudo conhecido por estes dias prova que o elevador social está avariado e que o mercado de trabalho está a aumentar o fosso das desigualdades sociais entre os jovens portugueses. Dito por outras palavras, os que são oriundos de famílias com baixos recursos, principalmente do Interior do país, ficam limitados a empregos precários e mal pagos.
“As habilitações literárias dos pais são atributos, não só geradores de diferenciação social, mas produtores de fortes níveis de desigualdade” entre os mais novos, refere o estudo “Os jovens e o trabalho em Portugal - desigualdades, (des)proteção e futuro”, cujas conclusões são vertidas num livro a publicar esta semana. E nem a maior democratização do acesso ao Ensino Superior quebrou o determinismo da condição de origem. A investigação identificou vários fatores que condicionam o sucesso profissional. Além da proveniência, social e geográfica, também o género persiste como fator de desigualdade. As mulheres ganham significativamente menos do que os homens, mesmo as mais qualificadas, o que as obriga a acumular mais do que um emprego. Um homem licenciado aufere, em regra, uma remuneração superior a uma mulher com mestrado ou doutoramento.
O que esta investigação veio comprovar é que o aumento do nível médio das qualificações no nosso país não está a ter o esperado efeito de elevador social. A lotaria do nascimento ainda é uma sentença de vida.