1- Os peregrinos concentravam-se em Fátima para ouvir o Papa. Ainda tentando assimilar, como todos os portugueses, a notícia sobre o aumento de impostos que aí vem. Foi quando um repórter da TSF decidiu pedir ao povo que cruzasse a mensagem de esperança de Bento com a mensagem de desesperança de Sócrates e de Passos Coelho.
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E do meio da multidão impôs-se a análise de uma mulher que não deixou que a emoção do momento se sobrepusesse à razão de todos os dias. Elencou uma série de propostas de poupança alternativas ao aumento da carga fiscal sobre os salários e concluiu, lapidar: "Agarramo-nos à nossa fé e à nossa esperança, mas sabemos bem quem temos. Já não podemos confiar nos nossos políticos. É lamentável, mas é mesmo assim".
2. Não sei se a peregrina já terá ouvido falar de Martine Aubry, líder do Partido Socialista francês, muito menos se leu as suas declarações sobre estes dias de turbulência e desorientação. Mas suspeito que concordaria com a análise demolidora que fez ao comportamento dos políticos que nos dirigem, aqui como na Europa.
Confrontada com a reunião de emergência dos líderes europeus [que haveria de conduzir, entre outras, à decisão de nos aumentar os impostos], Aubry descreveu-a como uma caricatura do sistema financeiro-liberal: "para salvar os povos nunca há acordo, para salvar as bolsas, sim". A filha de Jacques Delors lembrou depois que, na hora de encontrar soluções para sair da crise, há diferenças entre rigor [pouco usado, porque dá mais trabalho] e austeridade [muito usada, porque é mais fácil]: ou seja, entre gerir bem os dinheiros públicos ou impor soluções que garantem receitas imediatas, mas também empobrecimento e recessão económica.
3. O Mundo não mudou nos últimos 15 dias, ao contrário do que nos diz José Sócrates. Aliás, e no que diz respeito à irresponsável gestão dos dinheiros públicos, em Portugal não mudou mesmo nada. Ainda os portugueses ferviam com o aumento de impostos que lhes era imposto e já tinham mais um exemplo do regabofe que aí vem. Um secretário de Estado anunciava a anulação do concurso para a construção da terceira travessia sobre o Tejo, mas… apenas porque abrindo novo concurso daqui a seis meses se poderá usar na ponte o financiamento que estava reservado para a rejeitada linha de TGV entre Lisboa, Porto e Vigo.
De acordo com as contas apresentadas pelo governante, a ponte custará dois mil milhões de euros. Mas, por via desta habilidade, os fundos europeus vão pagar 500 milhões. Faltam 1500 milhões, é verdade, mas sobra "esforço patriótico" para os arranjar.