Pode não parecer pelo título, mas respeitando a tradição da época, a crónica de hoje é um Conto de Natal.
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Como já começa a ser normal nos contos de Natal, na estória que se segue não interessa nada quem a protagonizou, nem como é que eu soube disso. A única coisa que interessa é o espírito natalício que inspirou a escolha e que no fundo está presente na moral da estória.
Não era Natal, mas o casal estava profundamente apaixonado e uma viagem a Veneza é sempre romântica em qualquer altura do ano. Ainda muito jovens, tinham a natural preocupação de contar todos os tostões para que um planeamento mal feito não fosse capaz de estragar o idílio que previam. Chegados à cidade das gôndolas o rapaz quis saber quem melhor guardaria o dinheiro e onde. Mais decidida e mais segura de si a rapariga não o desiludiu e tranquilizou-o garantindo-lhe que o melhor era guardar ela o pecúlio. Ele, sem disfarçar a curiosidade , cometeu a indelicadeza de perguntar onde guardaria ela o dinheiro, mas recebeu uma resposta com que não contava em breves segundos: vou guardar as notas nas minhas cuecas. Foi tal a segurança com que ela respondeu que ele nada mais conseguiu balbuciar.
Consumado esse acordo foram passear, divertir-se, namorar e quando voltavam ao cair da noite para o hotel ele resolveu pedir-lhe uma nota para fazer uma compra. A rapariga fez um gesto muito parecido com aquele gesto que Ronaldo protagonizou no Mundial perante a incredibilidade geral e descobriu que tinha as cuecas no sítio, mas já não lá havia nota nenhuma. Apavorada, foi a vez de ser ela a contar com a serenidade e a compreensão do seu amor roubado: tem calma, vamos pensar onde poderás ter perdido o nosso dinheiro. Como é fácil de imaginar a rapariga lembrou-se dos sítios onde sabia que tinha tirado as cuecas. "Só pode estar no hotel ou naquele café onde fui à casa de banho". Despistado de imediato o hotel, o casal rumou em passo acelerado ao tal café da sua última esperança. Mal entraram no café era tal a sua expressão de ansiedade que o dono perguntou logo: "Vieram à procura de um maço de notas?" Já não me lembro, nem eles se lembram, quem foi o primeiro a responder que sim. Com as notas de novo na sua mão, quiseram saber como tinham aparecido. Tinha sido uma florista estabelecida na praça do café, que tendo ido à casa de banho as tinha encontrado no chão e as entregou ao dono do café. Ainda mal refeitos do susto que tinham apanhado, foram ter com a florista para agradecer o gesto e perguntar como a podiam recompensar. A florista respondeu-lhes com uma voz trémula dizendo apenas "Só de ver a vossa felicidade já tenho o coração cheio".
Feliz Natal, digo eu.
Empresário