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O Governo propôs e o presidente da República nomeou procurador-geral da República o magistrado do Ministério Público jubilado Amadeu Guerra. Este foi um profissional excelente e tem um currículo brilhante. Nada a apontar de negativo ao seu percurso de mérito. Não deixa, porém, de ser estranho a escolha ter recaído sobre um magistrado jubilado, com 69 anos, prestes a cumprir os 70, em Janeiro próximo. Acompanhando as declarações do ex-PGR, conselheiro Cunha Rodrigues, haverá que proceder, por isso, à alteração da lei vigente, por forma a permitir a continuação das suas funções para além do limite dos 70 anos ou, acrescento, terá de ser desenhada uma interpretação que admita tal solução. Especialistas, ouvidos pelo jornal “Público”, defendem que o PGR se pode manter no cargo depois dos 70 anos, mas, com o devido respeito, os respectivos argumentos não procedem. Na verdade, ao contrário do que afirmam, qualquer cidadão, magistrado ou não, que seja PGR, assume a categoria funcional de magistrado do MP, ficando absolutamente sujeito, sem excepções, aos ditames do Estatuto do MP, seus direitos, deveres, funções e responsabilidades institucionais. Numa magistratura que integra o poder judiciário, que na jurisdição penal assume a natureza de órgão autónomo de justiça, todos os seus representantes são magistrados do MP, sujeitos hierarquicamente, no topo, ao PGR, que para o exercício pleno das suas competências não pode continuar a ser um cidadão emprestado ao MP. Seria desprestigiar e subvalorizar o cargo e a magistratura que determina, coordena e fiscaliza. Enquanto dirigente máximo desta, assume os direitos, a responsabilidade e a natureza de magistrado do MP. Por outro lado, também se lhe não podem aplicar as regras da Função Pública para continuação nas suas funções, após o limite de idade prevista na lei respectiva. Quando tal ocorre, o magistrado tem de solicitar ao Conselho Superior do MP autorização para prosseguir o trabalho que desenvolvia no respectivo tribunal, autorização que, a ser concedida, é periódica, por seis meses renováveis. Teríamos então um PGR a prazo, já não responsável perante o Governo e o PR, mas sim perante aquele Conselho, dependendo deste a renovação, ou não, daquela autorização. Seria o absurdo. Acresce que, e sobretudo o art.oº 13.oº do Estatuto do MP, em vigor, diz clara e expressamente que “são magistrados do Ministério Público: a) o procurador-geral da República, b)...… até f)...”. O art.o 193º da mesma lei determina que “1- os magistrados do Ministério Público cessam funções: a) no dia em que completam 70 anos...”. É difícil uma interpretação que abranja o que não está na letra, nem no espírito do diploma. Por isso carece de ser resolvida com urgência esta questão que, no mínimo, não é pacífica e susceptível de enveredar por uma ilegalidade insanável, se não for esclarecida.
A autora escreve segundo a antiga ortografia